Bernardo não aparece nos próximos dias, não sei se está tentando me evitar.
Ouço a notícia de que estão preparando outra sala para ele, como escritório, no andar
superior. Não sei se é uma decisão de agora, não acredito que seja. Fiquei muito
confusa após nosso último encontro, tentei entender sua reação. Não consegui. Eu
tinha consciência do meu comportamento, do meu puro interesse, mas não era isso
que ele queria? Pensei que tínhamos um acordo. Como ele pôde reagir assim quando
eu ainda não havia feito nada? Eu ainda não havia lhe torturado o suficiente, como
prometi. De toda forma, talvez seja melhor assim. Agora ele pode me deixar
finalmente em paz.
Então lembro do seu rosto, quando o vi pela última vez, e uma dúvida me
percorre. Bernardo quer que eu o ame? Por que ele esperaria algo assim de mim?
Durante todos os nossos encontros, a única coisa visível era seu interesse sexual por
mim, não enxerguei mais nada. No entanto, avaliando a forma como foi capaz de se
deter no restaurante e a forma como pareceu ofendido na minha casa, talvez ele
estivesse esperando mais. Eu prometi fazê-lo sofrer, ele prometeu que me faria levá
lo a sério. Talvez ambos estivéssemos agora cumprindo nossas promessas: ele
sofrendo e eu preocupada com o que se passava em sua cabeça. No entanto, Bernardo
era um playboy, como diabos eu confiaria nele?
Dudu entra no meu escritório, me entrega um monte de papéis, explica alguma
coisa sobre eles e sai. Não consegui entender uma palavra, não quero lidar com isso
agora. A minha cabeça parece que vai explodir, durmo ainda menos agora. Tomo um
remédio, acho que vou para casa. Não aguento mais ficar aqui, depois justifico a
ausência. Pego minhas coisas, digo que tenho uma reunião para não ser questionada,
vou embora.
O dia está passando de uma maneira muito estranha, como se passasse em
recortes. Minha cabeça vai explodir. Estou na rua, numa calçada perto do ministério,
não tenho certeza para onde estou indo, alguém segura o meu braço. Eu sei quem é
antes mesmo de me virar.
“Você está bem?”, ele pergunta.
Bernardo também parece exausto.
“Eu não faço ideia, mas não é da sua conta”, respondo ríspida, retirando a mão
dele do meu braço.
“Laura, por favor.”
Eu me interrompo, olho para ele novamente.
“O que eu fiz pra você, Bernardo?”, quero saber.
Ele se aproxima, beija meu rosto, me abraça.
“Estamos no meio da rua”, eu aviso, amarga.
Bernardo beija meus cabelos.
“Eu não ligo”, diz.
Resmungo, abraçando-o também.
“O que você quer que eu faça?”, pergunto.
“Quero que goste de mim”, confessa.
Suspiro, cansada.
“Então vai ter que se esforçar muito mais”, limpo uma lágrima que escorreu.
“Você é péssimo nisso, Bernardo.”
Ele ri.
“Você também não é nada fácil, sabia?”
Resmungo de novo, emburrada. Ele ri mais uma vez, toma minha mão e me
leva dali. Não sei para onde vamos, eu só quero dormir.
Eu não era a única que precisava dormir. Bernardo me leva para sua casa, me
oferece sua cama, desmonta ao meu lado. Dormirmos por horas, nem sei quantas.
Quando desperto, ele não está mais ao meu lado, então eu o procuro pelo lugar imenso,
até encontrá-lo na cozinha. Não sei ao certo o que prepara, mas cheira bem.
Ele me encontra no meio do caminho, me segura pela cintura, me levanta.
Cruzo as pernas ao redor dele, estou presa ao corpo dele, olhando-lhe no fundo dos
olhos. Ele me faz sentar numa mesa, continuo prendendo seu corpo ao meu.
“Você dormiu bem?”, ele pergunta.
“Eu nunca mais vou brigar com você”, respondo rindo, ele gargalha.
Bernardo me beija, eu correspondo. Sua urgência se torna a minha também.
Agora já somos mais maduros, eu quero acreditar. Somos capazes de nos entender
melhor, eu me convenço.