O som das botas pesadas ecoava nas frias pedras da masmorra enquanto os guardas se aproximavam de Catarine, que jazia no chão, a pele marcada por ferimentos e queimaduras. A luz fraca da lamparina mal iluminava seu corpo exausto, e sua mente ainda lutava contra as sombras das torturas que havia enfrentado. Quando os homens se aproximaram, uma onda de terror percorreu seu corpo, não apenas pela dor física, mas pela certeza de que a situação estava prestes a piorar. Com brutalidade, amarraram cordas ao redor de seu pescoço, braços e pernas, tratando-a como um animal selvagem capturado. A pressão da corda em sua pele machucada trouxe novas agonia, e o arrastar do corpo contra o chão de pedra áspero fez com que um grito de dor escapasse de seus lábios. Ela sabia que estava sendo levada para um destino terrível, mas a impotência a paralisava.
Os guardas a puxaram para fora da masmorra e para o ar gelado da noite, arrastando-a por um corredor estreito que parecia interminável. Os ecos de suas vozes e risadas cruéis ressoavam em seus ouvidos, e a atmosfera opressiva era preenchida por murmúrios de uma multidão que aguardava. Cada passo era uma tortura, cada respiração um lembrete do estado de seu corpo dilacerado. Finalmente, chegaram a uma clareira iluminada por tochas, onde um grupo de homens de aparência austera se reunira em torno de uma fogueira crepitante. O tribunal estava montado, e os rostos dos clérigos eram implacáveis, a condenação já gravada em suas expressões severas. Catarine foi lançada ao chão, caindo de joelhos, enquanto as cordas eram afrouxadas apenas o suficiente para permitir que ela se levantasse, mas ainda a mantendo presa.
“O que temos aqui?” disse um dos clérigos, seu olhar frio fixando-se em Catarine. “Um demônio, uma bruxa que se entregou ao pecado e à devassidão. Você atacou inocentes e trouxe desgraça a esta comunidade!” Catarine levantou os olhos, a dor e a humilhação estampadas em seu rosto. “Por favor, eu não sou o que pensam que sou...” “Silêncio!” rugiu um dos guardas, empurrando-a de volta com o pé. “Você não tem o direito de falar! O seu tempo acabou. Você será julgada por seus crimes contra a humanidade e contra Deus!” Os murmúrios se intensificaram, e Catarine sentiu a pressão do medo crescendo dentro dela. O pânico tomou conta, e o desespero começou a escalar. Ela se lembrou de seus filhos, de Christian, da vida que havia construído. A certeza do que estava prestes a acontecer a golpeou como um soco no estômago. “Por suas atrocidades, você será condenada à fogueira!” anunciou o clérigo principal, levantando os braços para a multidão que começou a aplaudir, misturando-se ao murmúrio de aprovação. “Que suas chamas sirvam como um aviso para todos que ousarem cruzar a linha entre o bem e o mal!” Catarine foi arrastada em direção à fogueira, suas pernas tremendo sob o peso do pavor e da dor. A visão das chamas crepitando e subindo em direção ao céu a paralisou. Ela tentou resistir, mas as cordas a mantinham firmemente no lugar. “Não! Por favor, não!” ela gritou, mas sua voz foi tragada pelo riso e gritos de alegria da multidão.
Enquanto se aproximava do seu destino trágico, Catarine olhou para as estrelas, uma última tentativa de encontrar algum conforto nas memórias de sua vida antes da escuridão. O calor da fogueira começou a envolvê-la, e uma onda de resignação e desespero tomou conta dela, sabendo que, em breve, ela se tornaria parte das chamas, deixando para trás tudo o que amava. A noite estava carregada de tensão na alcateia de Silver Moon. Christian, Caspian e Demétrio se reuniram em um canto afastado, as sombras das árvores se projetando sobre eles como os próprios medos que sentiam. O clima pesado parecia refletir suas emoções, e a frustração crescia a cada segundo.
“Eros, o maldito que poderia facilmente usar seus poderes para nos ajudar, não está aqui. Eu procurei por todos os cantos e não sinto o cheiro dele!” Caspian esfregou as têmporas, a expressão de dor e exaustão nítida em seu rosto. “Droga... que merda,” ele murmurou, a voz embargada pelo desespero. Christian, irritado e apavorado, não podia suportar a ideia de ficar parado. “Eu não posso simplesmente ficar aqui! Eu preciso achá-la!” A determinação de Christian era palpável, e ele começou a se afastar, cada passo decidido por um único objetivo: encontrar Catarine. “Christian, espera!” Caspian e Demétrio gritaram, mas ele estava cego pela necessidade. A floresta se estendia à sua frente como um labirinto obscuro, e ele se lançou entre as árvores, buscando o cheiro dela, a essência que sempre o acalmava. Ao parar por um momento, uma onda de autodepreciação o atingiu. Por que tudo isso estava acontecendo? Ele se odiava por não ter protegido sua amada, por não ter sentido que algo estava errado. A solidão e a dor se tornaram seus companheiros mais próximos, e ele se deixou cair em pensamentos sombrios. Então, um movimento nos arbustos chamou sua atenção. Antes que pudesse reagir, Caleb apareceu, seus olhos brilhando na escuridão. “Papai,” disse o garoto, correndo para ele e envolvendo-o em um abraço apertado. Christian o segurou firme, sentindo o calor do filho como um raio de esperança em meio ao desespero. “O que faz aqui, filho?” Christian perguntou, tentando controlar a voz trêmula. O olhar preocupado de Caleb o desarmava, e seu coração se apertou ao perceber a inocência do menino. “Papai, onde está a mamãe?” Caleb o agarrou com força, a preocupação evidente em seu tom.
“Eu estou tentando achá-la, meu filho,” respondeu Christian, tentando manter a calma, mas o peso da responsabilidade era quase insuportável. “Eu vou com você,” insistiu Caleb, a determinação de uma criança que não entendia completamente os perigos do mundo. “Não, você precisa voltar pra alcateia onde é seguro. Fique com seu irmão Derik!” Christian falou, mas a resistência do garoto era inabalável. “Não, eu vou ficar com você!” A insistência de Caleb fez o coração de Christian se despedaçar. Ele queria protegê-lo, mas também não poderia deixá-lo sozinho. Antes que pudesse argumentar mais, um grito distante ressoou pela floresta, gelando o sangue nas veias de Christian. O eco do terror parecia se arrastar como uma sombra, e seu coração disparou. Ele olhou para Caleb, que também sentiu a tensão no ar. “Vamos!” Christian disse, segurando a mão do filho, enquanto ambos corriam de volta em direção à alcateia, os ecos dos gritos aumentando em intensidade. A escuridão os cercava, mas a determinação de Christian se solidificou. Ele não poderia permitir que nada acontecesse a sua família. A luta para salvar Catarine e proteger Caleb havia apenas começado.
A lua cheia iluminava a clareira da alcateia de Silver Moon, mas a beleza da noite rapidamente se transformou em um pesadelo. O som de armaduras e gritos humanos ecoava na escuridão, e a tranquilidade que antes reinava foi abruptamente destruída. Vários soldados, armados com lanças afiadas de prata e tochas acesas, invadiram o território sagrado dos lobisomens, como um enxame de sombras malignas. O ar estava pesado com o cheiro de fumaça e queimado. As cabanas de madeira, que abrigavam famílias inteiras, arderam em chamas, suas estruturas estalando e desmoronando sob o calor intenso. As chamas dançavam, refletindo o desespero e a impotência que permeavam o coração dos lobisomens. As labaredas lambiam os céus, deixando um rastro de cinzas e lamentos. Caspian e Demétrio, os mais poderosos da alcateia, sentiram a adrenalina correr por suas veias enquanto observavam a carnificina se desenrolar diante de seus olhos. Mas, apesar de seus imensos poderes, estavam paralisados pela quantidade impressionante de humanos que os cercava. O estômago de Caspian revirava ao perceber que, mesmo juntos, não eram páreos para a brutalidade e o número esmagador de soldados que atacavam sua casa.
Os lobos, que normalmente se moviam com graça e agilidade, agora lutavam contra a dor e a fraqueza. As feridas causadas pela prata em suas peles os impediam de se transformar, tornando-os vulneráveis e sem defesa. O grito angustiante de um de seus irmãos ecoou pela noite, enquanto um soldado fincava uma lança em seu peito. A cena era horrenda: os corpos se acumulavam no chão, e o solo já estava encharcado de sangue, um testemunho cruel da brutalidade do ataque. Christian assistia tudo ao longe, paralisado pela horripilação da cena. Seu coração batia descontroladamente, e a imagem de sua alcateia sendo devastada se gravou em sua mente como um pesadelo sem fim. Ao seu lado, Caleb, seu filho pequeno, estava em silêncio, os olhos arregalados em choque enquanto absorvia a realidade horrenda ao seu redor. O pavor era palpável, uma névoa densa que parecia sufocar a todos. “Papai, o que está acontecendo?” Caleb perguntou, sua voz trêmula quebrando o silêncio aterrorizante. “Fique perto de mim,” Christian respondeu, sem desviar o olhar da cena diante dele. Sua impotência o atormentava. Ele queria correr e lutar, mas a visão dos soldados exterminando seus irmãos o mantinha paralisado.
Enquanto isso, Caspian e Demétrio se encontraram encurralados, seus corpos feridos e sangrando. A luta era feroz, mas os ataques humanos eram incessantes. Um soldado, com a boca curvada em um sorriso maligno, lançou sua lança contra Caspian, atingindo-o no ombro. O lobo urrou de dor, mas a determinação em seus olhos não vacilou. “Precisamos sair daqui!” gritou Demétrio, sua voz rasgada pelo esforço. “Vamos nos reagrupar!” Eles lutaram como feras encurraladas, mas, a cada movimento, a cena se tornava mais desoladora. Cada golpe que desferiam não parecia o suficiente, e a sensação de desespero e impotência os envolvia como um manto pesado. Com um último esforço, eles conseguiram escapar do cerco, desaparecendo na floresta, suas feridas ardendo enquanto a vida escorria de seus corpos. Por trás deles, o massacre continuava. Os gritos de agonia e os sons de lâminas cortando carne se misturavam ao crepitar das chamas. O horror se espalhava como um câncer, e os lobos que antes eram uma comunidade unida estavam agora em ruínas, aniquilados sob a lâmina cruel da traição humana. Christian, ainda em choque, segurava Caleb perto de seu peito, ambos testemunhando a desgraça que se desdobrava diante de seus olhos, um pesadelo do qual não podiam acordar.
“Derik!” O pensamento de Christian disparou como um raio em meio ao caos. O medo apertava seu peito, e a urgência de proteger seu filho recém-nascido se tornava uma força insuportável. Ele pegou Caleb, colocando-o em suas costas, enquanto o garoto se agarrava a ele com força. “Segure-se em mim, filho! Haja o que houver, não me solte!” Ele ordenou, sua voz um sussurro angustiado enquanto suas pernas se transformavam, assumindo a forma lupina. Na transformação, uma onda de poder percorreu seu corpo, mas a sensação de impotência o acompanhava. Ao olhar em volta, viu suas cabanas em chamas, ouviu os gritos de sua alcateia ressoando na noite como um lamento. Cada passo em direção à sua casa era um ato de desespero, e ele sabia que o inimigo o cercava. Ao se aproximar da cabana, Christian viu um único guerreiro da alcateia lutando bravamente contra um grupo de soldados armados com lanças de prata, mas a cena era desoladora. O homem estava cercado, e a esperança de vitória era escassa. O coração de Christian despencou quando avistou Derik chorando em seu berço improvisado, a inocência de seu filho em risco.
Mas não havia tempo para hesitar. Ele precisava agir, mas uma avalanche de pavor o impediu. Os soldados humanos eram numerosos, e cada um deles estava armado e pronto para atacar. A prata brilhava como a lâmina de um executor, e a impotência o esmagava. Um dos soldados, cruel e decidido, lançou-se sobre o guerreiro da alcateia, fincando a lâmina em seu corpo. Christian não pôde fazer nada, apenas assistir enquanto aquele homem lutava até o fim, caindo diante da brutalidade do inimigo. “Tem um bebê aqui!” gritou um dos soldados, a surpresa em sua voz fazendo o coração de Christian acelerar.
“Um bebê?” outro respondeu, hesitando, mas Christian sabia que não podia contar com a misericórdia dos humanos. “Eu não tenho coragem de matar um bebê,” disse um deles, mas as palavras eram apenas um fio de esperança em meio à tempestade de horror. “Mas ele é um demônio também,” replicou outro, a frieza de seu tom cortando qualquer otimismo. “Leve ele para o clérigo decidir, então.” “Sim, senhor.” Christian se sentiu paralisado. A cada momento que passava, a situação se tornava mais desesperadora. Ele queria correr para dentro da cabana, mas a verdade era que, se se aproximasse, seria morto em segundos. O desespero o consumia, e ele se sentia impotente, incapaz de proteger sua família, de salvar Derik daquelas garras impiedosas. Com os músculos tensos e o coração acelerado, Christian respirou fundo, tentando organizar seus pensamentos em meio ao turbilhão. O rugido de sua ferocidade estava preso em sua garganta, mas a necessidade de agir o forçava a pensar. Ele precisava de um plano. Precisava resgatar seu filho.
Nesse momento, o lamento de Derik cortou o ar, e a dor em seu coração se intensificou. Ele se recusou a aceitar a derrota. Sem pensar duas vezes, ele se afastou um pouco, procurando uma oportunidade, uma abertura. Ele não poderia deixar que a inocência de Derik fosse levada. A noite ainda não havia terminado, e ele estava determinado a lutar até o fim. “O que vamos fazer, papai?” A voz de Caleb era doce, mas repleta de preocupação. Christian respirou fundo, tentando abafar a tempestade de emoções que o consumia. “Eu não sei, filho. Estou pensando,” respondeu ele, seu coração pesado como chumbo. O lobo andava de um lado para o outro, inquieto e desesperado, suas patas se movendo rapidamente sobre o solo. Como tudo isso poderia estar acontecendo? Como os humanos conseguiram encontrá-los de maneira tão fácil? As memórias de sua alcateia, de risadas e camaradagem, estavam sendo reduzidas a pó em questão de segundos. O cheiro de fumaça e sangue enchia o ar, uma lembrança cruel do que estavam perdendo. A única coisa que o mantinha ancorado à realidade era as pequenas mãos de Caleb, agarrando-se firmemente ao seu pelo branco, como se a força de seu filho pudesse afastar o horror que os cercava. Cada toque era um lembrete de que ainda havia algo pelo que lutar.
Christian decidiu seguir os guardas que levavam Derik, um instinto primitivo de proteger seu filho despertando dentro dele. Ele precisava descobrir para onde estavam indo, precisava entender o que estava prestes a acontecer. O pensamento de ficar parado, apenas assistindo enquanto o que restava de sua alcateia era consumido pelas chamas, era insuportável. Enquanto avançava furtivamente, ele via os corpos dos guerreiros de sua alcateia caídos ao chão, suas vidas ceifadas em um momento de pura brutalidade. O cheiro de queimado invadia suas narinas, uma mistura de sangue e destruição que enchia sua mente de desespero. As vozes dos soldados ecoavam ao longe, rindo e gritando ordens, um som que era como lâminas cortando sua alma. Ele não podia deixar que isso acontecesse. Não enquanto seu filho estivesse em perigo. A determinação ardia em seu interior, e, mesmo que a situação parecesse perdida, Christian se recusava a desistir.
Enquanto Christian seguia os guardas que levavam Derik, um aroma inconfundível atravessou seu olfato, como um farol em meio à escuridão. Catarine. O coração de Christian disparou. “Cate!” ele gritou em sua mente, a esperança acendendo uma chama em seu peito. “Papai, estou sentindo o cheiro da mamãe!” Caleb exclamou, sua voz carregada de entusiasmo inocente, que cortou o desespero que envolvia Christian como uma sombra. “Eu também, filho! Segure firme,” respondeu Christian, a determinação substituindo um pouco da sua angústia. Apressando o passo, Christian se dirigiu na direção do cheiro, sentindo uma mistura de alívio e terror. Ele sabia que Catarine estava por perto, mas a certeza de que estava em perigo mortal tornava a situação ainda mais insuportável. Os guardas estavam se aproximando de uma praça pública, e Christian pôde ver figuras encapuzadas que pareciam se preparar para algo horrível. Os clérigos da igreja estavam reunidos ao redor de uma estaca, onde Catarine foi amarrada, seus braços e pernas torcidos em ângulos desconfortáveis. O olhar de Christian se fixou nela, sua amada, e seu coração afundou ao ver o que lhe tinham feito. A palha estava sendo colocada em volta dela, e ele podia ver as faixas de seu corpo, agora cobertas de feridas, a dor refletida em seu olhar. “O que estão fazendo com ela?” a voz de Caleb trouxe Christian de volta à realidade. “Eu não sei, filho, mas precisamos salvá-la,” respondeu ele, a raiva crescendo dentro dele.
Os clérigos discutiam em sussurros sombrios, preparando-se para o que parecia ser uma execução. “Ela é uma bruxa! Temos que acabar com o mal que ela representa!” Um dos clérigos gritou, enquanto outros acenavam em concordância, seus rostos escondidos sob os capuzes, como se a covardia de seus atos se refletisse na escuridão que usavam. “Fique perto de mim, Caleb! O que quer que aconteça, não se afaste!” Christian ordenou, seus instintos de lobo em alta, determinado a enfrentar os clérigos e qualquer um que estivesse entre ele e sua amada. O tempo estava se esgotando, e a única coisa que ele sabia era que ele a salvaria, acontecesse o que acontecer. Christian se movia furtivamente entre as sombras, seu coração batendo como um tambor em sua caixa torácica. A praça estava tomada por um ar de tensão, e o cheiro de palha queimando se misturava ao perfume do medo que emanava das pessoas ali reunidas. Ele se posicionou atrás de uma coluna, observando de longe, tentando entender a situação, quando sua atenção foi atraída por um grupo de guardas que se aproximava de um clérigo que parecia ser o líder do evento macabro.
O clérigo, com sua vestimenta escura e expressão rígida, mantinha-se em pé, uma aura de autoridade envolvendo-o. Christian, de seu esconderijo, viu um dos guardas se aproximar, segurando algo em seus braços. A angústia atingiu Christian como uma onda ao perceber que era Derik, seu filho recém-nascido, chorando desconsoladamente. A cena se desenrolou diante de seus olhos em câmera lenta, e um grito estridente ecoou pela praça “Não!” gritou Catarine, suas forças quase se esgotaram, mas a fúria e o amor por seu filho deram vida à sua voz. “Por favor! Por tudo que é mais sagrado! Façam o que quiserem comigo! Mas não machuquem meu filho!” O desespero em seu grito cortou o ar, e Christian sentiu um nó se formar em sua garganta. O clérigo e os guardas se entreolharam, suas feições refletindo uma mistura de hesitação e determinação. “O que vamos fazer, senhor?” perguntou um dos guardas, sua voz baixa, mas cheia de dúvida. “O bebê é filho da bruxa. Então, ele é um demônio também. Ele merece ser eliminado!” O clérigo respondeu, seu tom implacável, mas Christian pôde notar uma centelha de hesitação nos olhos dos guardas. “Mas… senhor, é só um bebê!” O guarda insistiu, seu olhar traindo uma luta interna entre o dever e a compaixão.
Caleb estava em pânico, seus olhos arregalados refletindo o horror que se desenrolava diante deles. Ele se segurava firme no pelo branco de Christian, sentindo a tensão que pulsava no corpo do pai, a agitação transparecendo a cada movimento. O menino, ainda tão pequeno, mal compreendia a gravidade da situação, mas a dor e o desespero emanavam como uma onda, e ele não podia ignorar. “Papai, o que está acontecendo?” Ele perguntou, a voz trêmula, enquanto olhava para a cena caótica à sua frente. Christian não tinha palavras para confortá-lo, apenas a angústia e a raiva queimando em seu peito. Ele ouvia o grito desesperado de Catarine, sua mulher, ecoando em seus ouvidos, e a imagem dela, amarrada naquela estaca, era insuportável. A presença dos dois homens que deliberavam o destino de seu filho recém-nascido parecia monstruosa, uma sombra de crueldade pairando sobre a cena. “Maldição… que desgraça.” Christian murmurou, a impotência o consumindo. Ele olhou ao redor e viu a quantidade absurda de guardas, armados com espadas e lanças de prata, um exército pronto para atacar. O coração de Christian acelerou, pulsando contra suas costelas como um tambor em um desfile macabro. “Eu não posso me aproximar… eu serei morto em segundos…” O pensamento passou por sua mente como um grito silencioso, e a realidade de sua situação o atingiu como uma paulada. Ele não tinha escolha. Cada movimento, cada respiração, cada batida de seu coração parecia ecoar em um ritmo de desespero. Se ele se revelasse, não apenas arriscaria sua própria vida, mas também a de Caleb.
Christian sentiu a mão pequena de Caleb apertar seu pelo, e a inocência do filho o feriu ainda mais. O garoto estava absorvendo a cena, sem entender completamente, mas sentindo o peso da tensão no ar. Christian queria proteger Caleb, não apenas do perigo físico, mas do terror que permeava a realidade deles. O lobo olhou para o garoto, um lampejo de determinação cruzando seu olhar. “Caleb, fique aqui, não se mova!” Ele ordenou, sua voz rouca e firme. Ele precisava fazer algo. Algo que mudasse a maré dessa batalha. Mesmo que fosse a última coisa que fizesse, ele não permitiria que Derik, seu filho, fosse eliminado assim. Se os homens quisessem derramar sangue, eles teriam que passar por ele primeiro. O lobo inspirou profundamente, preparando-se para fazer o impossível. Caleb estava agarrado ao pelo do pai, seus pequenos dedos se entrelaçando como se sua vida dependesse disso. O medo o envolvia como uma nuvem negra, e as lágrimas escorriam por seu rosto. "Por favor, não me deixe aqui sozinho!" Ele implorou, a voz tremendo de terror. Christian podia sentir a força da criança em suas costas, e a dor que emanava do aperto de Caleb era uma lâmina afiada em seu coração.
"Caleb, escute, eu preciso salvar sua mãe e seu irmão." Christian disse, tentando manter a calma. Mas a criança estava apavorada demais para entender. Seus olhos estavam arregalados, o pânico transbordando em cada batida de seu coração. "Não, não, não!" Ele gritou, suas mãos apertando o pelo de Christian com uma força que fez o pai sentir uma pontada de dor. "Por favor, não me deixe!" "Merda..." Christian murmurou para si mesmo, a frustração e a impotência ameaçando engoli-lo. Enquanto isso, os guardas continuavam a deliberar sobre o destino de Derik, o recém-nascido, e o som da discussão era como uma lâmina cortando o ar. "Não é justo matarmos um bebê," disse um deles, sua voz revelando uma dúvida que parecia frágil em meio ao mar de brutalidade. Catarine, em sua agonia, continuava a gritar, sua voz cheia de desespero e amor maternal. "Derik! Derik! Por favor! Não machuquem meu filho!" A súplica de sua mulher ressoava em Christian, fazendo seu coração se apertar. A cena era um pesadelo vivo, e ele estava preso no meio dele, impotente para fazer algo. Caleb olhou para o pai, o medo refletido em seu olhar inocente, e a pressão do momento estava se tornando insuportável. Christian sabia que precisava agir. O instinto de proteção era mais forte que a lógica. “Caleb, fique aqui, eu volto,” ele sussurrou, forçando-se a olhar nos olhos do filho, buscando transmitir um pouco de coragem.
Mas Caleb não estava ouvindo. "Eu vou com você! Não me deixe aqui!" O garoto estava em pânico, suas palavras cortando Christian como facas. O lobo olhou ao redor, sabendo que não havia mais tempo. A cada segundo que passava, a situação se tornava mais crítica, e a vida de Derik estava em risco. Ele sentia que precisava fazer algo, mas a dúvida o consumia. A gritaria de Catarine ecoou em seus ouvidos, e o lamento da mãe por seu filho o atormentou. Christian respirou fundo, a decisão finalmente se formando em sua mente. Ele precisava agir. Não havia mais espaço para hesitação. O clérigo, com uma expressão de fervor fanático, ergueu a mão e ordenou com uma frieza aterradora: "Esquartejem a criança e coloquem fogo nessa bruxa!" A brutalidade das palavras ecoou pela praça, penetrando os corações dos que ainda tinham alguma humanidade.
"NÃO!" O grito de Catarine atravessou a noite como uma flecha, penetrante e cheia de desespero. Seu corpo estava amarrado, as cordas apertadas em seus membros, e mesmo assim ela se contorcia, lutando contra os grilhões invisíveis que a mantinham presa. O calor do fogo começou a arder, dançando ao redor dela como um predador faminto, mas o verdadeiro tormento eram os gritos de seu filho recém-nascido, sendo segurado por aqueles que haviam selado seu destino cruel. Os guardas, sem hesitação, acenderam o fogo. Chamas laranjas e vermelhas lamparinaram e se elevaram, como serpentes vorazes, envolvendo Catarine em um abraço ardente. O calor a atingiu em cheio, mas seu grito ecoou, reverberando em desespero e amor. "Não machuquem meu filho! Ele é inocente!" Sua voz se misturou com as chamas, um lamento que desafiava a própria natureza do que estava acontecendo. Enquanto o fogo consumia suas roupas, sua pele, e a consumia lentamente, ela não se permitiu desviar o olhar do pequeno Derik. Ele estava ali, amarrado, sua fragilidade exposta ao mundo cruel que os cercava. As cordas rasgavam sua pele delicada, e o medo nos olhos do bebê parecia transcender o tempo. "Por favor, não!" A voz de Catarine se tornava um grito rouco, mas sua determinação em proteger seu filho não vacilava, mesmo em meio ao inferno. Os guardas observavam, alguns com expressão de prazer sádico, outros hesitando, mas todos obedecendo ao que parecia ser uma ordem divina. A cena era grotesca, um ritual de crueldade onde a inocência estava sendo queimada em sacrifício. A fumaça subia para o céu, misturando-se com as estrelas, enquanto o chão da praça se tornava um campo de horror.
O desespero de Catarine ecoava em cada um dos que testemunhavam, e mesmo aqueles que hesitavam estavam consumidos pelo fervor do clérigo e pela expectativa de uma justiça distorcida. Ela sabia que suas forças estavam se esvaindo, mas seu espírito nunca se entregaria. "Eu não deixarei você, Derik!" sua mente gritava, e em meio à dor, ela encontrou uma centelha de esperança. O horror tomou conta dos olhos de Christian ao testemunhar a cena diante dele. Catarine, sua amada esposa, estava sendo consumida pelas chamas, gritos desesperados ecoando em seus ouvidos, enquanto seu filho recém-nascido, Derik, estava prestes a ser esquartejado por aqueles monstros. O mundo ao seu redor se tornava um turbilhão de dor e perda, e a impotência o esmagava. "Não!" O grito explodiu de seus lábios, uma onda de fúria e desespero. Em um ímpeto, ele avançou, seu coração pulsando com uma determinação feroz. "CATARINE! DERIK!" O rugido que saiu de sua boca era mais do que um grito; era um clamor primal, um eco de amor e dor que reverberou por toda a praça, paralisando os que o cercavam.
Mas antes que pudesse chegar a um centímetro de sua amada, as lanças de prata cortaram o ar e se cravaram em seu corpo. A dor foi instantânea, aguda, e ele gritou, não só pelo sofrimento físico, mas pela agonia de se sentir preso entre dois mundos, entre a necessidade de salvar sua família e o desejo de sobreviver. O sangue manchou seu pelo branco, um contraste trágico com a pureza de sua forma lupina. Ele sentiu a energia se esvair, e o pavor crescia. Catarine, em meio ao fogo, viu seu filho mais velho, Caleb, agarrado ao dorso de Christian, e sua voz rasgou o ar, repleta de pânico e amor: "CHRISTIAN! NÃO! SALVE CALEB!" As palavras dela atravessaram seu coração como lâminas. Ele estava paralisado, as opções se desenrolando diante dele como sombras ameaçadoras. Ele olhou para seu filho, os olhos arregalados de Caleb, fixos em seu pai, cheios de medo e insegurança. Christian sabia que, se continuasse, arriscaria não apenas a vida dele, mas também a de Caleb, o futuro da sua família. "O que eu faço?" Ele pensou, o dilema agonizante pulsando em sua mente. Naquele momento, a brutalidade do mundo parecia esmagá-lo. Ele olhou para Catarine, sua expressão desfigurada pelas chamas, mas ainda cheia de amor e determinação. Ele sabia que se a deixasse, poderia nunca vê-la novamente, e a ideia de perder tudo o que amava o consumia de desespero. Mas se avançasse, poderia levar Caleb a um destino igualmente sombrio.
Christian estava em um impasse, um coração dividido entre a paixão ardente de um pai e o amor devastador de um marido. As chamas dançavam ao redor de Catarine, e a luta dentro dele aumentava. No entanto, em meio a toda a dor e confusão, uma coisa era clara: ele não poderia permitir perder toda a sua família em uma única noite. O clérigo, com um olhar gélido e determinado, ergueu a mão e bradou: "Matem esses demônios!" Sua voz cortou o ar como uma lâmina afiada, e os guardas, como máquinas implacáveis, começaram a lançar lanças em direção a Christian e Caleb. O tempo parecia desacelerar enquanto as lanças voavam. Christian sentiu um frio na espinha, um pressentimento de que tudo estava prestes a desmoronar. Ele estava em movimento, mas a cena se desenrolava lentamente diante de seus olhos, como se o universo estivesse decidido a torturá-lo. Uma das lanças atingiu Caleb, e o garoto gemeu de dor, sua voz inocente sendo tragada pelo caos. "Caleb!" O grito de Christian ecoou com uma preocupação desesperada, um rugido que transbordava amor e terror. Ele virou a cabeça rapidamente, vendo seu filho preso na dor, ainda montado em suas costas, com a expressão de pânico refletida em seus olhos. "Não, não, não!" Christian urrou, a dor de ver seu filho ferido dilacerando seu coração. A imagem de Catarine, consumida pelas chamas, misturou-se à de Caleb, e ele percebeu que o tempo se esgotava. Os guardas, implacáveis, estavam focados em completar suas ordens.
Enquanto Christian tentava encontrar uma forma de escapar, o som dos gritos se misturava ao cheiro do sangue que impregnava o ar. Os guardas cercavam Derik, que ainda era um bebê indefeso, enquanto um dos homens, impiedoso, segurava a lâmina de prata com firmeza. Christian se sentiu paralisado, o horror queimando em seu peito ao ver a brutalidade se desenrolando diante dele. Em um movimento rápido e cruel, os guardas esquartejaram Derik, e os pedaços do pequeno corpo foram lançados na fogueira junto com Catarine. O fogo se alimentou dos restos da inocência, e as chamas dançaram em direção ao céu, como se a própria natureza estivesse chorando pela injustiça. O grito de Christian ecoou pela praça, um rugido de desespero e raiva, mas ele estava preso em um pesadelo sem fim. A cena se tornava um quadro de horror, a fumaça e as chamas envolvendo a visão de Christian. Ele sentiu a impotência tomar conta dele, um peso insuportável que o impedia de agir. Cada grito, cada movimento dos guardas era um golpe direto em seu coração. A dor de perder sua família se misturava com a fúria crescente, mas ele sabia que não podia fazer nada. O clérigo, com um sorriso triunfante, observou a destruição com satisfação, enquanto os guardas continuavam a avançar. Christian, com a respiração entrecortada, olhou para Caleb, que ainda se contorcia de dor em suas costas. O amor que sentia pelo filho se tornou seu único motivo de lutar. "Eu não vou deixar isso acontecer," ele pensou, o desejo de proteger seu filho acendendo uma chama de determinação em seu interior, mesmo quando o mundo ao seu redor estava desmoronando. O desespero dominou Christian como uma onda avassaladora. Ele sentiu o calor das chamas consumindo o ar ao seu redor, a fumaça tornando-se um manto sufocante que o envolvia. "Caleb!" ele gritou, mas a voz do filho estava silenciada, o garoto desmaiado em seu dorso, os olhos fechados e a respiração irregular. Christian não tinha tempo a perder. Ele respirou fundo, sentindo o peso da dor em seu coração enquanto olhava uma última vez para sua esposa, Catarine. As chamas dançavam ao seu redor, engolindo tudo o que conheciam. Ela estava amarrada à estaca, seu corpo cercado por um inferno de fogo e fumaça. As lágrimas escorriam por seu rosto, aquecidas pelo calor abrasador, e ela as sentiu evaporar rapidamente. Cada gota que caía era um lamento pela vida que estavam perdendo.
"Christian! Meu amor!" O grito de Catarine atravessou o caos, um apelo que penetrou as fibras mais profundas do ser dele. Mas, naquele momento, Christian sabia que não podia salvá-la. Ele forçou-se a se afastar, seu coração despedaçando-se a cada passo. "Desculpe, Cate!" Ele murmurou, a voz embargada, enquanto seu instinto de sobrevivência se tornava seu guia. Os olhos de Catarine estavam fixos no horizonte em chamas, observando a destruição de seu lar e, mais dolorosamente, a destruição de seu filho, Derik, que estava prestes a ser reduzido a cinzas. Ela olhou para baixo e viu os restos de seu pequeno, queimando junto com ela, cada pedaço de carne e pele consumido pelas chamas vorazes. O cheiro de queimado e o crepitar do fogo eram um lamento que ecoava em sua mente, e ela sentiu uma dor profunda, uma tristeza que parecia não ter fim. "Por favor, não!" ela gritou, o som se perdendo na fumaça. "Não, meu filho!" As lágrimas continuavam a cair, cada uma um testemunho do amor que ela sentia, mas rapidamente se evaporavam antes de tocar o solo. O calor era insuportável, mas o amor por Derik e Christian ainda a mantinha ancorada a esse mundo. Enquanto Christian corria com toda a força que lhe restava, seus músculos ardendo e sua mente gritando para não olhar para trás, a imagem de Catarine se apagando em chamas estava gravada em sua mente. Ele sentiu a dor de cada grito que ela emitia, uma ferida aberta em seu coração. O peso do que estava perdendo quase o derrubou, mas ele não podia parar. Não agora.
"Eu vou te salvar, Caleb!" ele gritou para si mesmo, o nome do filho ressoando como um mantra em sua mente. Ele precisava conseguir, precisava fugir dali o mais rápido que podia, e salvar a única coisa que restava de sua família. A única centelha de esperança que ainda iluminava seu mundo agora mergulhado na escuridão. A cada passo, ele lutava contra a visão do inferno que deixava para trás, impulsionado pelo amor inabalável que ainda tinha por seu filho único filho agora. Ele se lançou na floresta, seu corpo lutando contra a dor, cada batida do coração um lembrete do que havia perdido e do que ainda precisava proteger. E mesmo enquanto corria, a imagem de Catarine queimando em chamas era um eco interminável, uma lembrança do sacrifício que estava disposto a fazer por sua família, mesmo que isso significasse deixar a única mulher que amava ser consumida pelo fogo.
Christian corria pela floresta como um demônio em fuga, a adrenalina pulsando em suas veias enquanto seu coração batia descontrolado. Ele não sabia quanto tempo havia passado desde que se afastou daquelas chamas devoradoras, mas a dor e o desespero eram seus únicos companheiros. As patas machucadas batiam no solo, o sangue escorrendo e deixando um rastro no caminho que percorria. Cada passo era uma batalha entre o desejo de parar e a necessidade de avançar, de manter seu filho seguro a todo custo. Caleb estava desmaiado sobre seu dorso, as mãozinhas pequenas ainda agarradas ao seu pelo, um gesto involuntário de proteção que cortava o coração de Christian. O lobo parou por um momento, sua respiração pesada e ruidosa, enquanto as memórias horríveis invadiam sua mente como um pesadelo que não cessava. A imagem de Catarine, sua amada esposa, consumida pelas chamas, gritava em seu coração. As lágrimas queimavam seus olhos, mas não havia tempo para a tristeza. E seu filho recém-nascido, Derik, sendo tratado como um monstro, despedaçado em meio à brutalidade. Christian soltou um rosnado de dor, uma mistura de raiva e impotência, mas não podia se permitir sucumbir a isso.
Ele mergulhou mais profundamente na floresta, a vegetação espessa se tornando um abrigo temporário para suas almas despedaçadas. Mas mesmo ali, o eco das chamas e os gritos de sua família continuavam a ressoar em sua mente. Era um lamento incessante, uma tormenta que o mantinha em movimento, mas também o desgastava. A cada passo, ele lutava contra a escuridão que tentava envolvê-lo. Cada imagem de Catarine o encorajava a seguir em frente, a se lembrar do amor que compartilhavam, a paixão que os uniu e a vida que construíram juntos. Ele tinha que acreditar que ainda havia esperança, que ainda havia algo pelo que lutar. Caleb precisava dele. Christian fez uma pausa, olhando para trás, como se esperasse ver um fantasma do passado. A escuridão se aprofundava ao seu redor, mas ele sentiu a mão de Caleb se apertar em seu pelo, uma lembrança de que ainda havia vida, ainda havia amor. Ele respirou fundo, fechando os olhos por um momento, enquanto se preparava para continuar sua corrida. A dor e o desespero ainda o acompanhavam, mas agora havia também uma centelha de determinação. “Eu vou proteger você, meu filho,” ele murmurou, a promessa ecoando em sua mente. E assim, com a luz da lua iluminando seu caminho, ele se lançou novamente na noite, decidido a encontrar um novo lar e uma nova vida, mesmo que as memórias o perseguissem.
Uma semana se passou, mas o peso do horror ainda pairava no ar como uma sombra. Caleb estava sentado ao lado de uma fogueira, os olhos fixos nas chamas que dançavam, mas sua mente estava longe. A luz oscilante iluminava seu rosto pálido, revelando um olhar vazio, sem vida. O curativo improvisado em seu braço era um lembrete constante da dor que o aço de prata havia causado, uma dor que não apenas o feriu fisicamente, mas também rasgou seu espírito. Christian se aproximou, seu coração pesado com a tristeza que via refletida nos olhos do filho. Ele também carregava a dor da prata, uma lembrança brutal de sua luta pela sobrevivência, mas a agonia emocional de Caleb era ainda mais difícil de suportar. O lobo sentiu a urgência de cuidar do garoto, de trazê-lo de volta à vida, mesmo que fosse apenas um pouco. “Caleb... você precisa comer,” ele disse, estendendo um pedaço de pão em direção ao garoto, sua voz carregada de preocupação. Mas, ao se aproximar, Caleb deu um tapa na mão de Christian, rejeitando o alimento como se fosse veneno. O gesto era um grito silencioso de rebeldia e dor, uma declaração de que nada poderia trazer de volta o que havia sido perdido. Christian suspirou, sentindo o peso da frustração e da impotência. Como poderia convencê-lo a comer quando o menino estava mergulhado em uma depressão tão profunda? Ninguém poderia culpá-lo, depois de tudo que tinha visto, de tudo que havia perdido. Ele era apenas uma criança, e agora, essa criança tinha que carregar o fardo de um trauma que muitos adultos nunca suportariam.
A fogueira crepitava, lançando sombras dançantes ao redor deles, e Christian sentou-se ao lado de Caleb, tentando se conectar, esperando que a proximidade ajudasse a quebrar a barreira que se ergueu entre eles. Ele observou seu filho, o rosto marcado por um misto de dor e confusão, e sentiu o coração apertar em seu peito. “Caleb...” Christian começou, sua voz baixa e suave. “Eu sei que você está machucado. Eu também estou. Mas precisamos ser fortes, juntos. Sua mãe e Derik estariam orgulhosos de nós, e eles não queriam que nos deixássemos levar por isso.” Mas Caleb não respondeu, continuando a olhar para o fogo, seus pensamentos perdidos em um abismo escuro. Christian se sentiu impotente, como um lobo preso em uma armadilha, incapaz de escapar da dor que cercava seu filho. O silêncio entre eles era pesado, e as chamas da fogueira pareciam sussurrar segredos de um passado que nunca poderia ser recuperado. A noite se estendia, e Christian sabia que precisava encontrar uma maneira de trazer seu filho de volta à vida, de resgatar a luz que ainda poderia brilhar em seus olhos.
“Por favor, filho,” ele disse, com uma fraqueza que não costumava mostrar. “Coma. Estamos juntos nisso. Você não está sozinho.” Mas a resposta de Caleb foi apenas mais um silêncio profundo, e Christian percebeu que, por enquanto, tudo o que poderia fazer era permanecer ao lado dele, esperando que um dia, talvez, a esperança pudesse encontrar o caminho de volta para seus corações. Mais uma semana se passou, e Christian se viu vagando pelas florestas, um lobo solitário em busca de um lar que não existia mais. Ele havia se mantido escondido, evitando qualquer contato com os humanos que destruíram sua vida, mas agora era hora de retornar ao que restou de sua antiga alcateia. O que poderia ser uma volta à esperança logo se transformou em um pesadelo de desolação.
Ao se aproximar da antiga alcateia, uma sensação de desolação o envolveu. O cenário que antes era cheio de vida e camaradagem agora era apenas um campo de cinzas e ossos. O fogo havia consumido tudo o que ele conhecia, e o aroma de morte pairava no ar, misturado ao cheiro de fumaça e destruição. Ele parou diante do que restara de sua cabana, seu coração pesado ao ver os vestígios de sua vida antes da tragédia. Caleb estava ao seu lado, agarrando as pernas do pai com as pequenas mãos, um olhar vazio e distante nos olhos. O garoto parecia um fantasma, preso entre o que havia perdido e a realidade que agora enfrentava. Christian olhou para ele, tentando encontrar um sinal de vida em sua expressão inerte, mas a dor que ambos carregavam parecia os prender a um lugar sombrio, longe da luz. “Não há mais ninguém aqui,” Christian murmurou, sua voz quebrada pela tristeza. “Eles se foram.” Ele percebeu que, com isso, seu lar havia desaparecido para sempre. Sentiu a certeza de que não havia mais motivos para ficar naquela cidade maldita, um lugar que agora representava a perda e o desespero. “Precisamos ir embora, Caleb. Para sempre.” Ele começou a olhar entre os destroços de sua antiga cabana, revirando os escombros em busca de algo que pudesse levar consigo. A cada objeto encontrado, um lembrete doloroso do que fora: pinturas queimadas, roupas rasgadas, e fragmentos de memórias que pareciam escorregar por suas mãos como areia. Mas, em meio a tanta desgraça, algo chamou sua atenção.
No canto mais protegido, ainda firme e trancado, estava o baú de Catarine. O coração de Christian disparou, um misto de tristeza e esperança o invadiu. Ele se agachou, os dedos tremendo ao tocar o baú, que parecia resistir à destruição. Um sorriso triste se formou em seus lábios enquanto buscava ao redor, e logo encontrou a chave de prata que costumava usar. Ele hesitou por um momento, permitindo-se sentir a gravidade do que estava prestes a fazer. Com um movimento lento, inseriu a chave na fechadura e, ao abrir o baú, sentiu uma onda de lembranças invadi-lo. Dentro, encontrou o diário de Catarine, o vestido que ela usara no festival de outono — a noite em que fizeram amor pela primeira vez — e as pinturas que ela criara com tanto amor. Cada objeto era uma parte dela, uma lembrança que se recusava a ser apagada. Christian trancou o baú novamente, mas não antes de segurá-lo como se estivesse abraçando a própria vida. O peso da dor era insuportável, mas ele também sentia que ainda havia algo para se agarrar, um pedaço de amor perdido em meio ao caos. Ele se levantou, voltando sua atenção para Caleb, que permanecia ao seu lado, como um robô. O garoto mal piscava, preso em seu próprio sofrimento. Com um gesto carinhoso, Christian passou as mãos pelos cabelos negros do filho, desejando que aquela conexão fosse suficiente para trazê-lo de volta. “Vamos embora desse lugar. Eu não quero nunca mais ver essa cidade de novo.” Caleb, com a voz baixa e sem vida, respondeu: “Sem cidades, sem humanos.” Christian suspirou, sentindo o eco de sua própria dor na afirmação do filho. “Sim, filho, sem cidades, sem humanos.” Com o baú de Catarine em uma das mãos e o filho na outra, ele virou as costas para o passado. Sabia que o futuro era incerto, mas ao menos havia uma estrada a seguir, e com isso, ainda havia esperança.
Demétrio estava perdido em seus próprios pensamentos enquanto o barco balançava suavemente de um lado para o outro. A dor causada pela prata ainda pulsava em seu corpo, uma lembrança constante da brutalidade que havia enfrentado. Ele se reclinou contra a lateral do convés, gemendo baixinho, tentando ignorar as feridas que ainda ardia e a perda que o cercava. Olhando para a costa que lentamente se afastava, seu coração se apertou ao perceber que aquela cidade, uma vez cheia de vida e esperança, agora era apenas um vago eco de suas memórias. A antiga Silver Moon, seu lar, estava devastada, consumida pelas chamas e pelo ódio. Ele se sentiu um fantasma, preso entre o que fora e o que restara, enquanto as sombras de seus companheiros caídos dançavam em sua mente. "Um único dia," ele murmurou para si mesmo, a voz carregada de desespero. "Um único dia e tudo se foi." As imagens do ataque, dos gritos de desespero e da destruição ainda o assombravam. Ele fechou os olhos, tentando afastar as visões de seus amigos caídos e da dor nos rostos daqueles que ele amava.
Demétrio sentia o peso do luto sobre seus ombros, cada respiração se tornando mais difícil. Ele olhou para as águas do mar, a superfície refletindo o céu nublado acima, e se perguntou para onde iria a seguir. A incerteza o consumia; não havia mais um propósito claro, apenas a vontade de escapar. "Nunca mais," ele sussurrou, um desejo fervoroso de se afastar não apenas da cidade, mas daquele país que agora representava a perda e a traição. A brisa do mar era fria e cortante, mas ele não se importou. A sensação de liberdade que o barco oferecia era um alívio temporário, uma fuga das lembranças que o atormentavam. Mas mesmo assim, no fundo de sua alma, ele sabia que não poderia se afastar de sua dor. Demétrio olhou uma última vez para a cidade desaparecendo na linha do horizonte, sabendo que, independentemente de onde ele fosse, as cicatrizes que carregava seriam uma parte indelével de sua jornada.
Caspian estava acomodado na carroça, as feridas ainda pulsando sob as ataduras improvisadas. A prata, que ele tanto temia, ainda o atormentava, cada movimento uma lembrança aguda do horror que vivenciara. Ele observava a paisagem se afastar, a cidade que um dia fora seu lar agora se tornando uma mancha indistinta no horizonte. O viajante, um homem de aspecto robusto e pele curtida pelo sol, olhou para ele pelo canto do olho. "Para onde vai, garoto?" perguntou, sua voz grave misturando-se ao barulho da carroça e ao som dos cascos do cavalo que puxava a carga. Caspian respirou fundo, seu peito se contraindo sob o peso das memórias. "Para bem longe desse inferno," sussurrou, as palavras saindo como um lamento. A cidade, agora coberta de cinzas e lembranças amargas, era um lugar que ele não queria nunca mais ver. A destruição de sua alcateia, a perda de amigos, tudo isso ainda o assombrava, e ele estava determinado a deixar aquele pesadelo para trás.
Enquanto a carroça seguia seu caminho, Caspian permitiu-se um momento de reflexão. Ele fechou os olhos, permitindo que a brisa fresca do campo o envolvesse, tentando afastar a dor que ainda pulsava em seu corpo. O cheiro da terra, do ar limpo e da liberdade estava se infiltrando em suas narinas, mas não conseguia se livrar do peso do que havia acontecido. "Você não está sozinho, garoto," o viajante disse, como se percebesse a luta interna que Caspian enfrentava. "A vida continua, mesmo após as piores tempestades." Caspian abriu os olhos e olhou para o viajante, vendo um pouco de compaixão no olhar do homem. "Espero que sim," ele murmurou, suas palavras carregadas de dúvida. "Espero que sim." E enquanto a carroça avançava, levando-o para longe do inferno que deixava para trás, ele sentiu um pequeno fio de esperança se entrelaçar em meio ao desespero, uma chama tênue que ainda queimava em seu coração.
Eros caminhava entre as ruínas da antiga alcateia de Silver Moon com uma expressão de indiferença fria, o cheiro acre dos corpos em decomposição e da destruição só o fazia erguer levemente o nariz. Lobos eram, afinal, inimigos naturais dos vampiros, e não sentia nenhum lamento pelo fim daquelas criaturas. No entanto, ele observava atentamente cada corpo que passava, o olhar sombrio e penetrante, em busca de dois rostos específicos em meio àquele massacre: Christian e Demétrio. Eles eram mais do que exceções. Amigos de infância e confidentes em um mundo onde laços como esses eram raros e preciosos. O peso da possibilidade de perdê-los de maneira tão brutal lhe trazia uma inquietação que ele mal lembrava como era sentir. Olhando com desgosto para os restos da alcateia e tentando processar a cena, Eros foi abordado por um dos seus lacaios, que se aproximou em silêncio, carregando más notícias em seu semblante. "Meu senhor... houve uma caçada liderada por clérigos. Eles invadiram e massacraram a alcateia, caçando sem piedade." Eros continuou impassível, mas sua pergunta foi direta e fria. "Christian e Demétrio. Encontraram os corpos?" O lacaio abaixou a cabeça, hesitante. "Não, senhor. Não estão entre os mortos... ao que parece, conseguiram escapar." Uma tensão quase imperceptível se dissolveu no peito de Eros. Aquilo era tudo o que precisava ouvir. Ainda que a visão de lobos mortos não lhe causasse nada além de desprezo, a possível perda de seus amigos o havia perturbado. Sem olhar para trás, ele deu uma última olhada para as ruínas antes de se afastar. Silver Moon estava devastada, mas se seus dois velhos amigos sobreviveram, talvez ainda houvesse esperança de reconstruir aquilo que realmente importava.
Eros entrou em seu castelo, passando pelos corredores escuros e pelas imponentes janelas de vidro manchado que filtravam a luz da lua em tons avermelhados. Havia um peso sombrio em seu semblante enquanto ele caminhava até o salão principal, onde acendeu as velas cerimoniais e preparou o círculo arcano para realizar o feitiço de localização. Com movimentos cuidadosos, traçou runas negras no chão e, murmurando antigas palavras de poder, deixou que a magia o tomasse, espalhando sua presença como uma sombra pelo mundo à procura de Demétrio e Christian. Porém, apesar de todos os seus esforços, o feitiço não produzia nenhum resultado. Ele apertou os punhos, frustrado. “Merda…” murmurou para si mesmo, a palavra ecoando no vasto salão. Em seu íntimo, uma inquietação o consumia — como aquilo havia acontecido tão de repente? Saíra por apenas uma semana para visitar seus irmãos em um território distante, e ao retornar, a devastação tomara o lugar que uma vez pertencera a seus amigos. "Demétrio… Christian…" Ele se sentou pesadamente na cadeira de espaldar alto que ficava no centro do salão, encarando o vazio. A imagem de seus velhos amigos continuava viva em sua mente, trazendo lembranças da juventude compartilhada e da confiança construída ao longo dos anos. Silver Moon estava arrasada, e sem resposta do paradeiro dos dois, Eros sentia um vazio e uma irritação crescente. Por ora, o silêncio do castelo parecia ser sua única companhia, mas ele sabia que não iria desistir.
Eros se ergueu da cadeira, sua expressão rígida enquanto seus olhos percorriam o salão. Com um gesto rápido, chamou seus seguidores, que logo se reuniram em fila diante dele, atentos e silenciosos. A tensão no ar era palpável. “Ouçam bem,” Eros começou, sua voz baixa mas carregada de autoridade. “Nenhum de vocês descansará até que encontremos qualquer vestígio de Christian e Demétrio.” Sua mão enluvada apertava o punho da cadeira, e seus olhos fixavam-se nos vampiros à sua frente com uma intensidade sombria. "Percorram cada floresta, cada vila abandonada, cada canto escondido deste território e além. Façam o que for necessário." Ele fez uma pausa, os olhos ficando ainda mais penetrantes, e acrescentou: “Principalmente de Demétrio.” Uma sombra de melancolia passou por seu rosto. Demétrio era mais que um aliado de guerra, mais que um parceiro de jornadas sombrias e batalhas; era um laço que remontava aos primeiros dias de sua vida mortal. Eros caminhou até a primeira fileira, detendo-se frente aos seus subordinados. “Não aceito desculpas. Não aceito fracasso,” disse, a voz fria como gelo, “Não voltem aqui sem respostas.” Os vampiros se dispersaram rapidamente, desaparecendo no silêncio da noite. Eros ficou ali, sozinho por um momento, encarando o vasto e vazio salão.