A manhã seguinte nascia suave, mesmo depois da correria do dia anterior, enquanto a casa ainda repousava no silêncio dos sonhos. Mal o sol ensaiava seus primeiros traços pelas frestas, já nos movíamos em segredo, pés descalços no chão frio, guiados pela expectativa do dia. A despensa era nosso território conquistado, repleta de pequenos tesouros arrancados entre risos contidos e cumplicidade.
Lá fora, o orvalho ainda beijava a terra, e o quintal se descortinava como um convite à aventura. Corríamos livres, sentindo o mundo grande e nosso, até que uma voz doce, firme como as raízes das árvores do pomar, interrompia nossa travessura. Era vovó, guardiã das manhãs, com seu olhar sempre atento e seu sorriso que aquecia até os dias mais frios.
— Meninas, vocês lembram o que a mãe de vocês falou?
Maria respondeu saltando, leve e travessa, do alto do pé de cacau: — Lavar a roupa!
Prometemos que sim: a lavagem começaria ali, naquele instante, sem demora. Reunimos as roupas, improvisamos uma trouxa, e descemos, tropeçando e rindo, até o riacho onde a manhã espreguiçava as águas frias.
A natureza parecia vibrar em sintonia com nossa alegria. Patrícia, cheia de energia, escalou uma pedra e anunciou, com orgulho: — Gente, olha o que eu sei fazer!
— Uau! — gritei, enquanto eu, Patrícia, Maria e Deise nos lançamos na brincadeira, sem tempo contado: ponte humana sobre o riacho, estrelinhas desenhadas na areia úmida, saltos de pedra em pedra. O tempo parecia se dissolver entre vozes, gargalhadas e respingos reluzentes.
Horas depois, o chamado súbito de vovó cortou o ar como uma ventania que arrepia a pele: — Não terminaram ainda? Sua mãe está quase chegando!
Olhamos para cima; o sol já subia alto, denunciando o descuido. Num ímpeto, corremos para lavar as roupas pequenas, de qualquer jeito, apressadas e encharcadas de culpa.
Foi aí que Patrícia declarou, de sobrancelhas franzidas, fitando a calça de painho, coberta de barro endurecido: — Eu não vou lavar isso, não.
— Nem eu! — ecoamos, em uníssono, cada uma aguardando que a outra assumisse a tarefa menos desejada. Maria pegou algumas peças, todas sujas do mesmo jeito.
— Vamos bater par ou ímpar: quem perder, lava.
O jogo era rápido, inocente, e logo a sorte se decidiu: entre rodadas e suspiros de alívio, cada uma acabava com sua pequena pilha, e o trabalho seguia.
No final, nem sempre a sorte nos sorria. Maria, esfregando a calça encardida, murmurou com uma leve ironia: — Nem sempre a sorte está do nosso lado.
E entre algumas derrotas e muitas risadas, fomos aprendendo — entre água, sabão e histórias contadas — que crescer é, muitas vezes, partilhar o peso das tarefas e a leveza das memórias.