— Tem certeza de que isso é uma boa ideia? — Pergunto, enquanto espiamos os armários do vestiário do time de futebol através da janelinha de vidro na porta. Minha voz ecoa pelo corredor vazio, nos lembrando constantemente de que não deveríamos estar aqui, matando a penúltima aula de segunda-feira apenas para invadir o armário de Colin.
— Liz, eu não tenho certeza de mais nada ultimamente, e ajudaria muito se você não ficasse me perguntando isso. — Sarah responde.
Cassie revira os olhos e se volta para nós.
— Só vamos acabar logo com isso, está bem? — Sussurra, voltando a olhar através do vidro.
— Daisy não deveria estar aqui também? — Indago, e sinto uma tensão surgir de repente.
Sarah dá de ombros.
— Acha que ela estaria?
É um bom ponto. Daisy não tem estado muito presente entre nós desde a noite do acidente. Talvez ache que se afastar de nós a ajudará a esquecer o que fizemos, ou pelo menos diminuirá sua parcela de culpa na história, mas não acho que funcione bem assim. Seria simples demais, e nada nessa história é simples.
— Não seja dramática, Sarah. Ela só não está aqui porque disse que tinha uma prova importante. — Cassie responde, em defesa de Daisy.
Sarah revira os olhos e solta um riso sarcástico, como se Cassie estivesse sendo ingênua de propósito.
— Cassie, estamos na segunda semana de aula, não temos provas importantes ainda! — Exclama, irritada.
Cassie dá de ombros.
— Liz teve uma prova no primeiro dia de aula. — Argumenta, e Sarah pede para que ela faça silêncio e se concentre. No final das contas, "Daisy" parece ser apenas mais um dos assuntos que ela também gostaria de evitar.
Do lado de dentro das portas do vestiário do time, as luzes se apagam, e o ambiente está finalmente vazio. Esperamos alguns segundos até termos certeza de que não seremos pegas, e por fim, Sarah abre discretamente a porta, e entramos.
— Ugh. Esse lugar fede a meias sujas e queijo podre. — Resmungo, e Sarah me dá uma cotovelada para que eu faça silêncio enquanto ela liga a lanterna do celular.
— Sabe qual é o armário do Colin? — Pergunta.
— 239. — Respondo, sem hesitar, e as duas se viram para mim.
— Como sabe disso? — Cassie questiona, com um olhar irritantemente suspeito.
— Tínhamos aula de literatura juntos no ano passado e ele ficava balançando aquele maldito chaveiro com o número de seu armário como se fosse sua maior conquista na vida! — Exclamo baixinho, e Cassie cobre a boca, abafando uma risada.
— Achei! — Sarah exclama, no fim do corredor. Nos aproximamos dela. — Você... sabe a senha? — Pergunta, voltando-se novamente para mim.
— O que? É claro que não! — Respondo, como se a ideia fosse absurda, e ela bufa de ódio.
— Temos que descobrir, de algum jeito. — Ela fala por fim, como se fosse simples assim.
— Sarah, não temos todo esse tempo. — Protesto.
Antes que possamos nos aprofundar na discussão, Cassie nos afasta do armário e começa a mexer no cadeado, tentando insistentemente adivinhar a combinação de números.
— Quando é o aniversário dele? — Pergunta.
— Eu não sei.
— O número da camiseta do time?
— Não sei. — Respondo, mais uma vez.
Cassie suspira.
— Sabe se ele tem algum número da sorte?
— Eu sei lá! — Exclamo, começando a ficar irritada. — Ele é tão egocêntrico, porque não tenta o número de dias que ele está na Terra? — Sugiro, sarcasticamente, mas Cassie arregala os olhos e começa a fuçar nos números novamente, parecendo ter aceitado a sugestão ou ter tido alguma nova ideia.
O mais impressionante é quando o armário, de fato, se abre.
— Há! Eu sou demais. — Cassie se gaba, orgulhosa de si mesma.
Nós a observamos, confusas.
— Como fez isso? Sabe mesmo há quantos dias ele está na Terra?
Ela faz uma careta.
— É claro que não, nem ele deve saber isso. Só coloquei o ano em que ele nasceu, e deu certo. Ele definitivamente não é nenhum gênio das senhas.
— Bom, que seja. — Sarah fala, dando de ombros. — Vamos logo com isso antes que eles voltem para cá.
Ela se aproxima do armário escancarado, e começa a remexê-lo, retirando de lá o celular de Colin. Olho ao redor para ter certeza de que estamos realmente sozinhas, porque me sinto suja invadindo a privacidade de alguém dessa forma. Mas situações desesperadas pedem medidas desesperadas, então tento ignorar a parte da minha consciência que está me julgando por isso.
— Quem é que não coloca senha no celular hoje em dia? Que babaca... — Sarah murmura ao conseguir acessar facilmente os arquivos do celular.
— Você devia estar agradecendo. — Murmuro de volta, inquieta.
— Não encontrei nada no e-mail dele. — Ela fala, passando os olhos agitados pela tela.
— O e-mail de onde ele nos enviou a foto foi excluído, lembra? Tente achar a foto na galeria. — Cassie responde, começando a ficar quase tão inquieta quanto eu.
Sarah faz uma careta.
— Não quero acessar a galeria desse garoto! Quem sabe o que eu posso encontrar lá? — Ela diz, colocando o celular em minhas mãos.
— Por que está me dando o celular? Eu também não quero! — Contesto, devolvendo-o a ela.
Cassie revira os olhos, pegando o celular das mãos de Sarah.
— Podem parar com isso? Eu olho.
Ela percorre os olhos por toda a galeria, procurando pela maldita foto com a expressão mais tensa que já vi em seu rosto. Dá até para ver uma ruga se formando entre suas sobrancelhas franzidas, o que de repente me faz perceber a importância de acharmos essa foto na galeria de Colin, porque se não estiver aí, voltaremos á estaca zero, onde mais uma vez, não teremos ideia de quem está por trás disso tudo.
— Encontrei! — Ela exclama de repente, virando o celular para que possamos ver também. Sinto uma mistura de alívio e raiva percorrendo cada veia em meu corpo.
— Encontrou o quê? — Estremecemos com o som da voz masculina que surge de repente atrás de nós. Congelamos por alguns segundos, sem conseguir pensar em nada para dizer ou fazer. Fecho os olhos e solto um suspiro. Mais uma vez, fomos flagradas. Não sei o que pode acontecer agora.
Finalmente nos viramos para ele, que se aproxima de nós com uma visível irritação no olhar. Ele retira seu celular das mãos de Cassie e fica parado diante de nós, nos observando em silêncio.
— E então, agora vocês vão ficar brincando de espiãs e invadindo a minha privacidade? — Ele indaga, cruzando os braços.
— Só estamos atrás de algumas respostas. — Cassie fala, com naturalidade.
Colin arqueia as sobrancelhas, e é possível enxergar o suor escorrendo no canto de sua testa. Ele precisa de um banho.
— Então você acha que pode invadir a minha casa e meu armário atrás de respostas? — Ele fala, aproximando o rosto de Cassie, que dá um passo para trás, enquanto Sarah dá um passo á frente, pronta para defendê-la se necessário.
— Não sabíamos que a casa era sua até então, está bem? — Cassie explica, sem demonstrar um pingo de fraqueza em sua expressão.
— Ah, bem melhor! — Colin ironiza. Há um certo tom de acusação em sua voz, o que, infelizmente, preciso compreender.
Sarah suspira.
— Do que está reclamando, hein? Não teríamos feito nada disso se você não estivesse na nossa cola, em primeiro lugar. Agora, o mínimo que pode fazer é responder algumas de nossas perguntas. Talvez assim a gente pare de invadir sua privacidade. — Ela sugere, impaciente.
Ele estreita os olhos, analisando cada um de nossos rostos. Cassie e Sarah o encaram fixamente, enquanto eu evito levar meus olhos até seu rosto.
— Como sabia onde estávamos naquela noite? Você nos seguiu? Por que tirou a foto? E por que a enviou para Liz e não para todas nós? Se sabe o que nós fizemos naquela noite, por que ainda não contou a ninguém? O que quer com tudo isso, afinal? — Sarah dispara, e um sorriso se forma no rosto de Colin.
Ele solta um riso de deboche.
— Não é bem assim que as coisas funcionam, princesa.
Sarah franze o cenho, intrigada.
— Eu adoraria contar o que sei ou explicar por que fiz essas coisas, afinal, é óbvio que vocês estão perdidas. Mas tudo tem um preço.
Sarah e Cassie cruzam os braços, atentas ao que ele tem a dizer, enquanto eu tenho que conter a inquietação dentro de mim que me dá vontade de sair correndo em direção á porta, sem olhar para trás. Algo me diz que seu preço não será nada justo.
Colin passa os olhos pelos rosto de Cassie, Sarah, e por fim, para no meu. Sinto que fica uma eternidade me encarando, e tento não parecer muito incomodada com isso.
— Quero sair com você. Um encontro de verdade, e eu conto tudo que quiser saber. — Fala, ainda olhando para mim. Os rostos de minhas amigas se voltam para mim. Por um segundo, fico sem reação. Em seguida, solto um riso que parece sair do fundo da minha alma, e Sarah me dá uma cotovelada no braço.
— Não vou fazer isso. — Digo, tanto para ele quanto para elas.
Colin dá de ombro, jogando uma toalha em seu ombro molhado de suor.
— Tudo bem. A escolha é sua. Não sou eu quem está afundando em problemas. — Fala, naturalmente, nos dando as costas e caminhando em direção aos chuveiros. — Se mudar de ideia, sabe como me encontrar. — Grita, por último.
Cassie e Sarah o assistem partir, e então se viram para mim, com um olhar que expressa tudo o que estão sentindo a relação a essa conversa.
— Liz, você está maluca?! — Sarah vocifera — Precisa sair com ele! Precisamos dessas respostas!
— Por que? Já sabemos que foi ele, o que mais precisamos saber?
— Precisamos saber por que ele ainda tem essas fotos e como pretende usá-las contra nós! — Cassie responde, parecendo tão zangada quanto Sarah.
— Se ele quisesse nos entregar, já o teria feito. Além disso, não vou sair com Colin quando estou com Noah! — Exclamo em justificativa, apesar de achar que isso já deveria ser óbvio.
As duas suspiram, irritadas.
— Liz, nem é um encontro de verdade! Eu tenho certeza de que Noah não irá se importar. Ele confia em você e sabe o quanto isso é importante para a gente.
Não preciso nem dedicar muito do meu tempo pensando a respeito, porque se tenho certeza de uma coisa em meio a tantas dúvidas é que jamais quero ter que sair em um encontro com Colin.
— Não vou sair com Colin. — Reforço, com convicção. — Sinto muito, mas não podem me fazer mudar de ideia.
As duas tentam argumentar, mas antes que tenham chance, dou-lhes as costas e caminho para fora daquele vestiário estupidamente fedido, mancando feito uma idiota que cortou a perna em um acidente estúpido, mas uma idiota determinada.