As coisas já não eram mais as mesmas quando abri os
olhos pela manhã. No entanto, percebi que essa mudança
não havia ocorrido de forma drástica; ela se desenrolou
gradualmente, seguindo um ritmo quase imperceptível.
As transformações acontecem assim, de maneira sutil,
pouco a pouco, sem que nos demos conta, lentamente e
incessantemente. E, de repente, em questão de segundos,
me dei conta de que nada, absolutamente nada,
permanecia como antes. Fui envolvida pela mudança,
mesmo sem querer, e eu mesma já não era a mesma.
Com o passar do tempo, muitas coisas mudaram dentro
de mim. Já estava na fase adulta, mas ainda carregava
em meu ser aquela mesma essência de garota sonhadora
de quando era criança. A facilidade de sorrir ainda me
acompanhava, embora eu tenha aprendido, ao longo dos
meus 26 anos, que as coisas não eram tão fáceis como
imaginava quando era pequenina. As brigas bestas de
irmãos foram substituídas por desilusões amorosas, que
não tinham a mesma prontidão de resolução de quando
se é criança. A dureza e a correria da capital me faziam
relembrar memórias da vida tranquila que havia ficado
há anos de distância. Eu já estava morando em São
Paulo, com minha prima Vê e o Oscar, os quais
considero meus segundos pais. Minha mãe e minhas
duas irmãs, Patrícia e Deise, moravam no interior da
capital paulista, que era consideravelmente perto de
mim. Estava longe apenas do meu pai, que ainda morava
na Bahia, com meus outros dois irmãos, Maria e
Estevinho. Já havia me tornado mãe do meu querido
filho, Arthur, e também era tia das minhas adoráveis
sobrinhas, Eloah e Heloisa. Nossa querida vovó havia se
tornado uma estrelinha, mas ela seguia viva em nossos
corações e manifesta em nossas memórias. Após me
tornar mãe solo, a responsabilidade de encontrar alguém
especial se multiplicou, afinal, não se tratava apenas do
meu futuro, mas também do futuro do meu filho. Para
me apaixonar, precisaria ser alguém realmente especial.
Para ser sincera, estava tranquila quanto a isso. Graças a
Deus, eu tinha todo o apoio do mundo. A Vê e o Oscar,
dindos do Arthur, além de darem muito amor,
proporcionavam todo o conforto e muitos mimos
possíveis. Além disso, podia contar com a rede de apoio
da minha mãe e das minhas irmãs. Eu teria bastante
tempo e calma para escolher uma pessoa para me
relacionar, o que não era meu foco no momento. A Um
Sorriso de Distância Estava focada na faculdade e na
minha carreira de escritora independente, privilégios do
século 21. Numa noite fria de agosto, enquanto escrevia
poemas, criei um em particular que descrevia
nitidamente minha paixão pelo meu sorriso. Sim, sou
apaixonada por ele. Uma coisa valiosa que aprendi ao
longo dos anos é que você precisa se apaixonar por si
mesmo, se amar e se cuidar, afinal de contas, você é seu
próprio lar. Meu sorriso sempre foi minha porta de
entrada, e frequentemente fazia poesia sobre ele.
Manifestei assim:
Ela sorria porque era sorridente, a vida não era leve,
mas ela sorria contente. Ela sorria quando alguém lhe
dava bom-dia, Ao abraçar sua mãe, conversar com sua
tia. Ela sorria nas dificuldades, sabia que o mundo tinha
muita maldade, mas dentro de si algo sorria. Ela sorria,
não que a vida fosse perfeita, mas ela sorria com toda
sua beleza, alma e compaixão. Ela sorria para o vizinho,
para o mendigo, até para o seu João, que falava mal do
seu irmão. Ela sorria em pensamento e com seu olhar
atento estendia a mão. Um dia, eu vi aquela menina,
com tanta alegria que encheu meu coração. Enquanto
ela sorria, encantava a multidão.
Assim que terminei e revisei meu pensamento expresso
em verso, empolgada, liguei para minha mãe. Após dois
toques, ela atendeu ao telefone. — Oi, minha filha —
disse ela ao atender. — Atendeu depressa — questionei
entre risadas e, em seguida, cumprimentei: — Bença,
mainha. A senhora não vai acreditar, fiz um poema lindo
sobre meu sorriso. Recitei meu poema para ela, que,
muito orgulhosa, comentou: — Muito lindo! Será que
podemos ter a presença dessa ilustre escritora na
inauguração da minha igreja? — brincou ela. — Igreja?
— indaguei confusa. — Sim, vou abrir uma igreja com o
pastor aqui perto de onde moro. — Legal! Não sabia —
respondi. Até onde eu sabia, minha mãe fazia cultos na
garagem da casa dela. Abrir uma igreja era um avanço.
Ela sempre foi boa em liderança e comunicação era o
forte dela. Falar de Jesus é o grande chamado da vida
dela. — Claro que sim — respondi, contente, e logo
perguntei: — Quando vai ser? E ela foi me explicando
calmamente: — As festividades iniciarão em 30 de
setembro, dando início a um final de semana cheio de
atividades. Concordei e confirmei minha presença de
imediato. Eu não sabia na época, mas aquele convite,
embora aparentemente normal, logo após escrever um
poema sobre meu sorriso, dava início a uma sequência
de acontecimentos interligados. Algo magnífico estava
para acontecer. No fim das contas, não é todo dia que se
encontra o verdadeiro amor. O convite viria em outro
momento se não fosse aquele; obviamente, minha mãe
mais cedo ou mais tarde, iria me convidar. Mas o que
mais me chamou a atenção é que foi exatamente naquela
circunstância, como um roteiro de filme, como se algo
maior e lindo já estivesse predestinado a acontecer e
tudo estivesse meticulosamente conectado com meu
sorriso. O amor estava a um sorriso de distância e só
precisava estar lá para sorrir.
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