Apesar da
grande tecnologia, seu planeta era muito inferior, considerado o lado moral.
Desconhecia-se a misericórdia, a piedade, o amor ao próximo. Eram poucas as
pessoas que tinham superioridade moral e cultivavam virtudes. Se fizermos um
paralelo com os ensinamentos espíritas atuais, diríamos que aos habitantes de
Artúrio faltava a asa do amor. Daí XPZ4 não ter compreendido as atitudes e os
ensinamentos de Jesus.
Um dia,
estando em sua casa em Artúrio, pensava:
“Se Ele
podia transformar a água em vinho, curar doenças e expulsar maus espíritos, por
que não se havia salvado da cruz? Se aquela mulher havia mesmo traído seu
marido, porque havia Ele a libertado da punição merecida? Por que falava Ele em
perdão quando a vingança é o que reabilita o homem perante a sociedade?”
Reconhecia
a superioridade de Jesus, mas o achava estranho. Não conseguia compreender seus
ensinamentos, sua postura tolerante e bondosa, mas havia Nele algo de tão
superior que ele, XPZ4, não conseguia entender.
E
perguntava-se: “Como um homem tão superior aos demais habitantes podia viver ao
lado de pessoas tão ignorantes? Qual seria seu objetivo? Ele dizia ser
responsável por conduzir o povo da Terra a Deus, mas é muito pouco para um
homem com Sua inteligência. Não creio que seja isso. Impor-se a todos,
provavelmente, é seu real objetivo. Dominar as massas, escravizar os mais
fracos. Só pode ser isto. Ganhar a confiança para depois escravizar e impor sua
vontade. E o povo, atrasado, entrega-se a Ele, sem compreender seus reais
objetivos, por causa de algumas curas e manipulações químicas que faz. Ele deve
ter escondido substâncias que fazem a água mudar de cor e de sabor e que
enganam o paladar, de forma que o povo pensou que Ele transformou a água em
vinho. Pensando assim, Ele deve ser realmente um grande mago e, além de fazer
tudo isso, deve ter-se libertado da morte. Não creio que Ele tenha morrido,
pois, morto, como poderá conquistar o mundo?”
Envolvido
nesses pensamentos, desejou procurar em todo o Universo onde se encontrava
aquele Homem estranho para ele, para conhecer-lhe as intenções relativas ao
povo da Terra. Não acreditava que Jesus tivesse morrido e achava que a
crucificação teria sido uma farsa muito bem elaborada pelo próprio Jesus.
Afinal, não era Ele um mago, e aquele que foi crucificado não poderia ser um
clone? Provavelmente deve ter fugido em sua nave e deve encontrar-se em algum
lugar do Universo. Se Jesus quisesse uma dominação efetiva, ele, XPZ4, poderia
fornecer armas, pessoal treinado nos combates em seu planeta e aeronaves. A
vitória seria fácil demais. Implantariam o governo em Roma e expulsariam o
imperador. E pensava: “Quando Ele disse que sua missão não era destituir César,
talvez não tivesse falado a verdade”.
Porém,
também pensava em Jesus de outra forma. Pensamentos opostos também estavam
presentes em suas conjecturas. Achava que aquele Homem poderia ser o próximo
governante de seu planeta, concorrendo às eleições que se aproximavam, levando
em consideração sua desenvoltura e seus conhecimentos, que percebia ele serem
no mais alto grau. Participaria de sua campanha eleitoral, seria Seu cabo
eleitoral dedicado e faria todo o possível para que fosse eleito. Prometeria
cargos, altos salários, lançaria mão de falcatruas sem conta. E, depois que
Jesus fosse eleito, ele, XPZ4, provavelmente receberia um cargo de confiança e
um alto salário.
Todavia,
uma coisa o decepcionava em Jesus: a sua bondade. Considerava que Jesus não
fosse capaz de ser um bom administrador. Não imporia ordem, não aprovaria leis
duras para conter um povo por si só imoral e conivente com todos os erros. E
quem sabe seria Ele condenado à morte por querer tudo certinho, por ser
considerado um fraco de caráter? E, neste caso, sua carreira como astronauta
seria abalada por ter ele ajudado a eleger uma pessoa “fraca de caráter” para o
cargo mais importante de seu planeta. E concluía:
— Acho
melhor eu ficar quieto e não me envolver com Ele.
Convocado
para novas conquistas, XPZ4 chegou ao planeta Anfibius, da nebulosa Pelo de
Raposa.
O povo,
ainda atrasado, tinha um conhecimento tecnológico equivalente ao período
compreendido entre o final da Idade Média e o início da Idade Moderna da Terra.
A invasão
foi feita. Armas paralisantes e congelantes deixaram o povo petrificado. Muitos
donos de terras, ricos fazendeiros e sacerdotes entregaram suas fortunas, todo
ouro que possuíam, abandonaram suas casas e fugiram para o deserto. Outros se
esconderam em mosteiros, levando suas fortunas em ouro e pedras preciosas e
prometendo aos monges dividirem com eles metade de suas fortunas assim que tudo
voltasse ao normal e as forças armadas conseguissem expulsar os invasores.
Porém, com suas naves, XPZ4 os acompanhava e os detinha em suas fugas. De nada
resolvia esconder-se, pois XPZ4 mandava matar monges e monjas e colocava em seu
lugar alguns de seus subordinados, para que assumissem a direção dos mosteiros.
Daí a alguns dias tudo era saqueado, os religiosos eram mortos juntamente com
aqueles que se tinham escondido tentando fugir de sua violência.
No deserto
impedia a chegada das pessoas aos oásis, incendiando e acabando com as árvores
que poderiam fornecer alívio para o calor, e todos morriam sem água e sem
comida sob o sol escaldante.
Um homem
idoso dizia:
— Senhor,
não me mate nem a minha família. Entregarei toda a minha fortuna – dizia o
homem, rico senhor de terras.
E XPZ4,
implacável, respondia:
— Velho
miserável, que me importa tu ou tua família? Entrega-me tudo o que possuis e
pede perdão a Deus de teus pecados, antes que eu te transforme numa pedra de
gelo ou te paralise os movimentos para sempre, destruindo-te os músculos.
— Senhor,
misericórdia!
— Em meu
planeta não existe esta palavra. Aprende a nova língua de teus senhores e
esquece as palavras misericórdia, perdão e compaixão. Somos conquistadores
espaciais e a partir de agora somos nós que governamos teu planeta. Se eu
resolver te poupar a vida, deverás obedecer-me sem perguntar. Portanto, se
acreditas em misericórdia, roga agora a Deus que ta conceda.
O pobre
velho, antes arrogante e prepotente, se transformara em um ser submisso e
obediente. E XPZ4, poupando-lhe a vida, o obrigava a conduzi-lo aonde houvesse
pessoas ricas e poderosas, para que pudesse submetê-las ao seu comando.
A
população foi quase toda dizimada e o governo de Artúrio foi instalado naquele
planeta. Mais uma conquista, mais dinheiro em seu bolso, mais prestígio em seu
planeta, mais uma divisa em seu uniforme, mais sujeira em suas mãos, mais vazio
em sua alma, mais solidão em sua vida. Todavia, procurava justificar-se
recordando os benefícios que a tecnologia de Artúrio instalava nos planetas
conquistados:
— Oregon
tem máquinas agrícolas, Pláton, da nebulosa Cara de Palhaço, tem a tecnologia
dos computadores, Místicus, da nebulosa da Galinha Fugitiva, tem a tecnologia
das usinas nucleares, Fórbicus, da nebulosa Omega, não sofre mais com a seca.
Tudo isso é benefício para o povo, ainda que esteja sob o governo de Artúrio.
Um dia,
porém, sonhou com as paisagens da Galileia, onde Jesus lhe aparece e lhe dirige
a palavra:
— XPZ4,
quem fere com a espada com a espada se ferirá. Não te cansas de destruir e de
matar? Achas que fazes o bem tirando a independência e a liberdade dos povos? O
que fizeste de tudo o que ouviste de minhas pregações? Não te recordas mais do
“amai-vos uns aos outros”?