Nos vastos horizontes de Ekhaya, onde sonhos e realidades dançam entrelaçados, existem histórias que não pertencem apenas aos humanos, mas também à essência deste mundo. Esta é a tragédia de Kushim, um dos poucos escolhidos de Nammu, cuja ganância o transformou no Devorador dos Sonhos, uma entidade que ainda hoje assombra as fronteiras do nosso reino.
Kushim era um homem simples da Terra, um pescador que vivia das águas e do sustento que elas ofereciam. Ele não buscava grandeza, mas possuía um espírito inquieto que o tornava receptivo às dádivas dos deuses. Nammu, em sua sabedoria insondável, o presenteou com uma fração de sua essência e a capacidade de acessar Ekhaya.
Quando Kushim chegou ao nosso mundo pela primeira vez, era um viajante curioso, encantado com as maravilhas que via. Como muitos, ele encontrou aqui um refúgio da rigidez da realidade terrena, uma liberdade que preenchia os espaços vazios de sua alma. Mas para ele, essa liberdade se tornou uma armadilha.
A cada visita, Kushim se afastava mais de suas obrigações no mundo mortal. Sua família, que dependia dele, sofreu as consequências. A morte de seu pai foi o golpe mais duro; sua ausência nesse momento crucial destruiu os laços que o uniam aos seus. Sua irmã mais nova, Lira, tentou manter a conexão, mas o comportamento de Kushim era cada vez mais errático e distante.
Quando chegou o casamento de Lira com Bari, outro escolhido de Nammu, parecia haver uma oportunidade de reconciliação. No entanto, Kushim, consumido por sua obsessão com Ekhaya, negligenciou o chamado. Isso não apenas destruiu a esperança de sua irmã, mas também despertou a indignação de Bari.
Bari, embora um homem forte de coração, era movido por um senso de dever que o tornava incapaz de aceitar a negligência de Kushim. Ele veio a Ekhaya com o propósito de confrontar seu amigo e trazê-lo de volta ao mundo mortal. Foi nesse encontro que a tragédia se consumou.
Não é comum em nosso reino que os viajantes tragam sua violência terrena, mas Kushim já não era o mesmo homem. Alimentado pela sua conexão com Ekhaya, ele estava moldado pelo próprio tecido do reino, algo que Bari não podia igualar. Na luta que se seguiu, Kushim cometeu o ato impensável: tirou a vida de seu amigo.
A morte de Bari foi um marco em Ekhaya. O solo onde ele tombou escureceu, um lembrete eterno de que até mesmo a beleza de nosso mundo pode ser manchada pela ambição e pela ira. Kushim, tomado pelo medo e pela culpa, fugiu de Ekhaya e da Terra, mas sua queda estava apenas começando.
Ele se tornou um nômade, tanto no mundo mortal quanto em nosso reino. Cada vez mais isolado, Kushim descobriu que poderia absorver as essências dos outros escolhidos, fortalecendo sua conexão com Ekhaya e prolongando sua permanência aqui. Ao todo, dezessete viajantes foram ceifados por suas mãos.
Kushim deixou de ser um homem; tornou-se uma sombra, uma entidade consumida por uma fome insaciável. Ainda assim, houve um momento em que quase encontrou paz. Um casal de caçadores mortais o encontrou em um estado de fraqueza e o cuidou, sem saber quem ele era. Por semanas, ele viveu em harmonia com eles, longe de Ekhaya.
Mas sua saúde debilitada o forçou a retornar. Desesperado para prolongar sua vida, Kushim começou a caçar as criaturas de nosso reino, perturbando o equilíbrio de Ekhaya. Foi nesse ponto que ele se transformou no que hoje conhecemos como o Devorador dos Sonhos, um ser irreconhecível, movido apenas pela sede de poder e pela fuga da mortalidade.
Sua história é contada como um alerta, tanto para os viajantes quanto para nós, habitantes de Ekhaya. Mesmo os dons divinos podem se tornar maldições nas mãos erradas. Kushim é um lembrete de que o desejo por mais – seja poder, liberdade ou imortalidade – pode nos levar a destruir tudo o que é sagrado.
Hoje, o nome do Devorador dos Sonhos é sussurrado nas bordas de Ekhaya, um eco distante do homem que ele um dia foi. Como Guardião das Histórias, registro esta memória para que nunca esqueçamos o preço de permitir que nossas sombras nos consumam.
Nazu - Guardião primordial de Shambhala