

wilcipolli @wilcipolli
Rapsodo, o micropolítico.
Pensei, esses dias, nos rapsodos da Grécia pré-homérica. Aqueles sujeitos que vagavam de cidade em cidade, cantando mitos com ar solene, como quem transmite a mais pura verdade — ainda que nem sempre o que diziam fosse verdade. O curioso é que, para aquela gente, o mito era quase como a ciência é para nós: um meio de entender o mundo, de saber o que aconteceu em outro lugar, em outro tempo. Mesmo que soubessem que era invenção, juravam de pé junto que era real. O importante, talvez, nunca tenha sido a verdade, mas a narrativa.
O rapsodo não implorava para ser acreditado. Ele apenas dizia. Acreditar era escolha de quem ouvia. E isso o isentava, em parte, da culpa por espalhar mentiras. Ele só queria cantar — como quem reza, como quem transforma o ambiente com som e palavras. Fazer isso lhe bastava. Se a história era falsa, pouco importava.
Mas, como sempre, havia limites. O rapsodo não podia se estabelecer em qualquer pedaço de terra. A cidade já tinha donos — mesmo antes do capitalismo como o conhecemos. A divisão entre os que possuíam e os que vagavam já estava posta. Não era possível plantar fora da pólis, pois o mundo lá fora era perigoso. E dentro dela, tudo tinha um custo: obediência, trabalho, renúncia.
Pensei, então, que esse rapsodo antigo tem algo do nosso vereador de hoje. Sim, o vereador. Aquele que percorre os bairros ouvindo histórias, coletando pequenas tragédias do cotidiano e depois se posta em uma tribuna qualquer para cantar — com menos lira e mais microfone — os mitos do bairro, do povo, da cidade. O que ele diz entra para a ata. Registra-se. E nem sempre é verdade.
Mas quem liga?
O vereador, como o rapsodo, quer apenas contar sua história. Não precisa enfrentar dragões nem desafiar os deuses — basta que o escutem. Talvez até saiba que o que diz não é bem verdade, mas se a versão agrada, se rende voto ou prestígio, já cumpre sua função. Também ele é vigiado: não por sacerdotes ou filósofos, mas por câmeras, repórteres e adversários atentos. Não pode afirmar que um monstro engoliu o orçamento do bairro, mas pode, com palavras bem colocadas, sugerir que tudo se perdeu num labirinto invisível chamado “burocracia”.
No fundo, ambos se alimentam do mesmo: serem ouvidos. De transformarem o silêncio dos outros em plateia.
O rapsodo cantava para viver. O vereador fala para sobreviver politicamente. A diferença é que o primeiro encantava pelo mito; o segundo, pelo disfarce do real. Ambos, no entanto, acabam dizendo mais sobre quem escuta do que sobre o que dizem.

wilcipolli @wilcipolli
Não gosto de sirenes. E quem gosta?
O terror do neandertal residia na hipótese de algum indivíduo demonstrar um comportamento súbito e histérico — certamente o cheiro de sangue já rondava seus narizes. Desde o princípio, o sujeito — com lama nas nádegas, peles apodrecendo sobre os ombros e as mãos mais lascadas do que as pedras que tentava fazer chispar — já saía gritando e pulando ao avistar um cavaleiro igualmente fétido se aproximando para saquear a tribo.
Com o tempo, esse comportamento foi substituído por alguém encarregado de alarmar a aldeia, de modo mais civilizado, mas não menos barulhento e histérico, batendo sinetas presas aos portões da comunidade. Assim, no meio da noite, todos pulavam da cama e se refugiavam nas florestas, tentando escapar das invasões bárbaras. Os pais tapavam a boca das crianças que resfolegavam forte — mas o maldito grilo não cessava seu canto, e, dessa forma, ele próprio servia de sirene aos invasores, que, guiados pelo som, encontravam a família escondida e a degolavam.
Mais tarde, ainda não menos barulhentos, mas certamente mais eficientes, surgiram as sirenes antiaéreas, soando quando se avistavam os terríveis aviões bombardeiros. Porque não basta a matança ser mais eficaz, nem a tecnologia evoluir absurdamente em relação aos primeiros povos — é preciso também aprimorar a técnica de agredir-nos os ouvidos e gerar pânico generalizado. Antes fosse uma sirene que causasse surdez espontânea; assim, a pessoa morreria em paz, bastaria fechar os olhos, e seria como morrer dormindo. Ao menos, não morreria ao som da sirene.
Diga-me: quem se agrada ao ouvir uma sirene? Ainda hoje, ela é símbolo de ocorrência, caos e sofrimento — pois, se não for crime, é incêndio, enchente ou algum moribundo clamando por socorro

wilcipolli @wilcipolli
Trecho de minha obra autobiográfica inacabada.
"(...) Nossa casa ficava menos de três minutos de caminhada da residência de minha avó. Minha mãe, meu irmão e eu a visitávamos rotineiramente nas manhãs, um hábito que, na infância, me transmitia uma sensação de estabilidade.
Foi nessa época que o cheiro de um orvalho matinal impregnou-se no meu subconsciente. Um aroma sorrateiro e sinestésico, que não precisava de um dia específico para se manifestar. Bastava um instante qualquer; a falação de uma escola próxima, a calçada sendo varrida pelo vizinho idoso, o sol amarelo das nove, o papagaio falastrão do vizinho, ou o caminhão de gás a tocar Für Elise, de Beethoven. Era a síntese de um contentamento infantil, um símbolo da unidade familiar que, ainda ingênuo, eu acreditava ser inabalável.
Tenho viva a lembrança de desejar que aquele aroma jamais me escapasse. E, para minha angústia, ele nunca escapou.
Imagine você, em seus dias mais cinzentos — na puberdade transbordando hormônios, no luto por um ente querido, no instante exato em que percebe que um sonho fracassou — ser subitamente arrastado de volta para a infância por um odor nostálgico. Uma época que, talvez, nunca tenha sido tão perfeita quanto parece.
Boa recordação torna-se tortura."

wilcipolli @wilcipolli
1704
Na busca por sabedoria,
tornei-me conhecedor.
Apenas conheço.
O saber habita em mim,
mas sou só ele —
e nada mais.
O que me faltou?
Livros, não.
Faltou molhar os pés
no rio da existência.
Faltou sentir.
Na busca por sabedoria,
Fracassei.
Como um bom estudioso.
Ouvi o sábio da maçã:
"A luz é uma ponte
entre ti e o mundo.
Ela toca,
reflete,
e retorna aos teus olhos."
Minha visão te tateava,
tanto quanto minha mão.
Mas na busca por sabedoria,
eu não soube te olhar.
Fui tolo —
sábio não.
Por quê?
Porque agora
não posso mais tocar.
Nem minha mão te alcança,
nem meu olhar.
E o rio da existência
segue,
sem ti.
Sem ti, saudade.

wilcipolli @wilcipolli
Espelho, espelho meu
O tempo passa, firme, inexorável,
no espelho, a face se transfigura.
Espreita o vidro, olhar interrogável,
buscando a juventude que foi pura.
A bruxa indaga ao vidro tão cruel,
se ainda reina, jovial, sua nação.
Mas vê no rosto um traço mais fiel,
um sulco fundo em lenta erosão.
Desperdiçamos quando ainda jovens,
segundos raros que não retornam.
A eternidade não serve aos homens,
que de tique, em taque, evaporam.
Jamais pedimos para aqui nascer,
mas suplicamos para não perecer.

wilcipolli @wilcipolli
Título: Bia Fit.
Eu só queria treinar em paz. Só isso. Desde que decidi participar do Campeonato Municipal de Agachamento Profundo (sim, isso existe), minha vida se resumia a duas coisas: descer e subir. Joelho flexiona, joelho estende. Nada de firula. Nada de distração.
Até que ela chegou.
Bia Fit. Ou pelo menos era o nome que estampava sua garrafa d’água, seu top, sua toalha, seus stories, sua existência. O problema? Bia Fit não treinava. Bia Fit performava.
Ela fazia do agachamento um evento multimídia. Três takes por repetição. Um filtro para cada gota de suor. Texto motivacional, enquetes, desafios. “Cada curtida, um agachamento!” “Cada compartilhamento, uma superação!”
Para mim, um inferno. Porque, enquanto ela verificava as notificações, a barra de agachamento ficava lá, parada, esquecida, como um figurante de luxo.
Eu podia reclamar? Podia. Mas e se... e se eu desse a ela o que ela queria?
Criei perfis fakes. Vários. A cada postagem dela, eu despejava curtidas e comentários como um algoritmo enlouquecido. "Maravilhosa!" "Inspiração!" "Rainha do agachamento!" Ela queria engajamento? Pois então.
E funcionou. Funcionou bem demais.
Dias depois, a academia estava vazia. Minha barra, livre. Bia Fit sumira.
Foi um alívio. Treinei como nunca. Fiquei forte, veloz. Estava pronta.
Então chegou o dia do campeonato.
E quando anunciam a próxima competidora...
Bia Fit.
Com patrocínio, uniforme personalizado, um treinador particular. Fiquei em choque. Como? Como aquilo aconteceu?
Foi só depois que entendi. Meus perfis fakes não a sabotaram. A impulsionaram. Ela virou um fenômeno. Tanto engajamento atraiu seguidores, que trouxeram patrocínio, que trouxeram dinheiro. Dinheiro suficiente para que ela abrisse sua própria academia.
E enquanto eu me equilibrava sob o peso da barra, vendo aquela mulher agachar como se tivesse molas no joelho, caiu a ficha.
Eu só queria treinar em paz. Ela queria vencer.
Eu odiava a performance. Ela transformou a performance em poder.
Quando anunciaram sua vitória, engoli a frustração.
Aprendi uma lição? Sim.
Mas antes... vou ali criar mais uns perfis fakes. Tem outra competidora que me irrita.

wilcipolli @wilcipolli
O Rádio no Deserto
Era uma manhã quente e sem promessas de alívio quando o avião caiu. Um grupo militar em missão secreta foi forçado a fazer um pouso de emergência no deserto imenso após uma pane na aeronave. A situação era desesperadora. No entanto, havia algo que os mantinha vivos: a limitada carga do avião. Comida, água, medicamentos... aquilo era tudo o que tinham. Mas sabiam que não duraria muito. Mesmo com a morte do comandante e do piloto, o grupo ainda era composto por cinco pessoas, e os recursos estavam cada vez mais escassos.
No primeiro dia, o subcomandante assumiu a liderança e ordenou que, em duplas, fizessem patrulhas pelos arredores. A ideia era aumentar as chances de serem encontrados ou, quem sabe, encontrar algum pedaço do avião, que logo seria coberto pela areia. A rotina era exaustiva. As patrulhas se sucediam a cada hora, sempre com a esperança de que, de alguma forma, algo poderia mudar: um sinal de resgate ou, talvez, algum objeto que pudesse ajudá-los.
Foi então que, em uma dessas patrulhas, encontraram algo que parecia um milagre: o rádio portátil do comandante. Ele havia morrido na queda, mas o rádio... ah, o rádio parecia ser a chave para a salvação. Era o único meio de comunicação, o último vestígio de esperança de contato com o mundo exterior.
Os rádios militares funcionam em pares, mantendo uma frequência única que só se conecta entre si. O rádio do comandante estava sintonizado com o rádio de outro grupo, que não havia caído com o avião. No entanto, o problema era que eles estavam fora de área, em um deserto vasto e isolado. O que restava era a procura por algum lugar que conseguisse manter o contato, o que parecia uma missão impossível. O clima estava tenso. Cada um com suas estratégias e formas de lidar com a solidão e o medo, mas sempre fiéis ao subcomandante, que era o único a manter algum senso de ordem.
Durante uma patrulha noturna, o soldado comentou com o cabo que o acompanhava:
– "Um rádio caríssimo, tecnologia de ponta, à prova d'água e inútil. Que decepção."
Após uma breve reflexão, o cabo respondeu:
– "Não é à prova d'água."
A patrulha deles já estava terminando, mas o tempo foi o suficiente para que se estressassem ao ponto de uma discussão acalorada. Gritos e xingamentos se espalharam pelo deserto, reflexo do calor, da desidratação e da falta de qualquer perspectiva de resgate. Quando chegaram ao acampamento, o soldado, ainda em seu ímpeto de provar que o rádio era, sim, à prova d'água, fez o impensável: mergulhou o rádio no último cantil de 5 litros de água. O cantil já estava pela metade, e era a única água que restava. Ao mergulhar o rádio, um pouco da água foi espalhada, deixando quase nada no fundo do recipiente.
Quando percebeu o erro, a lucidez finalmente o atingiu.
Ele retirou o rádio da água, mas foi em vão: as luzes do rádio começaram a apagar lentamente, e a frustração tomou conta do grupo. Todos estavam incrédulos com a atitude. Alguns, tomados pela raiva, cogitaram punições severas, talvez até a morte. Contudo, após uma longa madrugada de discussões, todos seguiram as ordens do subcomandante.
– "Alguém morrer agora será sem necessidade, se todos já estivermos destinados a isso. Não sabíamos se o rádio de fato funcionaria. E, apesar da falha fatal, este asno permanecerá trabalhando conosco. E, se formos resgatados, ele responderá ao setor jurídico da instituição."
Na manhã seguinte, após horas de caminhada, algo apareceu no horizonte. Em meio ao nada, um brilho se destacou na areia. Era uma lâmpada. A patrulha, exausta e cética, levou o objeto de volta ao acampamento. O subcomandante, ao observar a lâmpada, teve uma ideia. Talvez fosse uma chance. Talvez fosse um sinal. Talvez fosse magia.
Sem hesitar, ele esfregou a lâmpada. Como em um conto de fadas, um gênio apareceu diante deles. Era imponente, envolto em fumaça, e sua voz grave e autoritária ecoava no ar. O desespero misturava-se à expectativa. O gênio ofereceu um único desejo ao grupo.
Todos, então, refletiram. Um filme com todas as probabilidades passou diante de seus olhos. O desejo de salvarem-se tomou conta deles. Mas logo perceberam que pedir dinheiro, joias ou até mesmo comida não resolveria. Estavam ali, no deserto, para sobreviver. Precisavam de algo mais criativo.
Foi então que o homem que havia destruído o rádio, tomado pela culpa e agora com os olhos brilhando, adiantou-se. Ele estava convencido de que algo tão simples poderia ser a solução. Olhou para o gênio e, com voz firme:
– "Quero um rádio…"
Todos ficaram catatônicos, incrédulos, e o bonachão ainda decretou:
—… à prova dágua!
O gênio o encarou, surpreso — pernas amolec...
Leia mais...
O Rádio no Deserto
Era uma manhã quente e sem promessas de alívio quando o avião caiu. Um grupo militar em missão secreta foi forçado a fazer um pouso de emergência no deserto imenso após uma pane na aeronave. A situação era desesperadora. No entanto, havia algo que os mantinha vivos: a limitada carga do avião. Comida, água, medicamentos... aquilo era tudo o que tinham. Mas sabiam que não duraria muito. Mesmo com a morte do comandante e do piloto, o grupo ainda era composto por cinco pessoas, e os recursos estavam cada vez mais escassos.
No primeiro dia, o subcomandante assumiu a liderança e ordenou que, em duplas, fizessem patrulhas pelos arredores. A ideia era aumentar as chances de serem encontrados ou, quem sabe, encontrar algum pedaço do avião, que logo seria coberto pela areia. A rotina era exaustiva. As patrulhas se sucediam a cada hora, sempre com a esperança de que, de alguma forma, algo poderia mudar: um sinal de resgate ou, talvez, algum objeto que pudesse ajudá-los.
Foi então que, em uma dessas patrulhas, encontraram algo que parecia um milagre: o rádio portátil do comandante. Ele havia morrido na queda, mas o rádio... ah, o rádio parecia ser a chave para a salvação. Era o único meio de comunicação, o último vestígio de esperança de contato com o mundo exterior.
Os rádios militares funcionam em pares, mantendo uma frequência única que só se conecta entre si. O rádio do comandante estava sintonizado com o rádio de outro grupo, que não havia caído com o avião. No entanto, o problema era que eles estavam fora de área, em um deserto vasto e isolado. O que restava era a procura por algum lugar que conseguisse manter o contato, o que parecia uma missão impossível. O clima estava tenso. Cada um com suas estratégias e formas de lidar com a solidão e o medo, mas sempre fiéis ao subcomandante, que era o único a manter algum senso de ordem.
Durante uma patrulha noturna, o soldado comentou com o cabo que o acompanhava:
– "Um rádio caríssimo, tecnologia de ponta, à prova d'água e inútil. Que decepção."
Após uma breve reflexão, o cabo respondeu:
– "Não é à prova d'água."
A patrulha deles já estava terminando, mas o tempo foi o suficiente para que se estressassem ao ponto de uma discussão acalorada. Gritos e xingamentos se espalharam pelo deserto, reflexo do calor, da desidratação e da falta de qualquer perspectiva de resgate. Quando chegaram ao acampamento, o soldado, ainda em seu ímpeto de provar que o rádio era, sim, à prova d'água, fez o impensável: mergulhou o rádio no último cantil de 5 litros de água. O cantil já estava pela metade, e era a única água que restava. Ao mergulhar o rádio, um pouco da água foi espalhada, deixando quase nada no fundo do recipiente.
Quando percebeu o erro, a lucidez finalmente o atingiu.
Ele retirou o rádio da água, mas foi em vão: as luzes do rádio começaram a apagar lentamente, e a frustração tomou conta do grupo. Todos estavam incrédulos com a atitude. Alguns, tomados pela raiva, cogitaram punições severas, talvez até a morte. Contudo, após uma longa madrugada de discussões, todos seguiram as ordens do subcomandante.
– "Alguém morrer agora será sem necessidade, se todos já estivermos destinados a isso. Não sabíamos se o rádio de fato funcionaria. E, apesar da falha fatal, este asno permanecerá trabalhando conosco. E, se formos resgatados, ele responderá ao setor jurídico da instituição."
Na manhã seguinte, após horas de caminhada, algo apareceu no horizonte. Em meio ao nada, um brilho se destacou na areia. Era uma lâmpada. A patrulha, exausta e cética, levou o objeto de volta ao acampamento. O subcomandante, ao observar a lâmpada, teve uma ideia. Talvez fosse uma chance. Talvez fosse um sinal. Talvez fosse magia.
Sem hesitar, ele esfregou a lâmpada. Como em um conto de fadas, um gênio apareceu diante deles. Era imponente, envolto em fumaça, e sua voz grave e autoritária ecoava no ar. O desespero misturava-se à expectativa. O gênio ofereceu um único desejo ao grupo.
Todos, então, refletiram. Um filme com todas as probabilidades passou diante de seus olhos. O desejo de salvarem-se tomou conta deles. Mas logo perceberam que pedir dinheiro, joias ou até mesmo comida não resolveria. Estavam ali, no deserto, para sobreviver. Precisavam de algo mais criativo.
Foi então que o homem que havia destruído o rádio, tomado pela culpa e agora com os olhos brilhando, adiantou-se. Ele estava convencido de que algo tão simples poderia ser a solução. Olhou para o gênio e, com voz firme:
– "Quero um rádio…"
Todos ficaram catatônicos, incrédulos, e o bonachão ainda decretou:
—… à prova dágua!
O gênio o encarou, surpreso — pernas amoleceram-se ao seu redor — mas fez um gesto com a mão. Instantaneamente, o rádio apareceu entre os dedos do homem. Todos ficaram em silêncio, observando o objeto, encarando a própria morte. O gênio, prestes a desaparecer em fumaça, olhou para ele e, com um sorriso sarcástico, fez a pergunta:
– "Mas vai falar com quem?"
Ver menos...

wilcipolli @wilcipolli
"Em um futuro distópico, a sociedade foi moldada para a máxima eficiência, reduzindo cada indivíduo a uma única função, desempenhada mecanicamente ao longo da vida. O sistema, administrado por uma inteligência artificial, mantém a ordem sem o que os habitantes saibam — até que Évora, uma jovem encarregada de passar cadarços em tênis, começa a questionar sua realidade.
Ao inovar na maneira de amarrar os cadarços, desencadeia uma revolução inesperada, despertando nela dúvidas mais profundas. Sua busca por respostas a leva a um grupo rebelde que descobriu a verdade oculta — a IA não somente coordena, mas governa a humanidade."
"Fragmentos", esta é a sinopse da inédita novela de ficção distópica. Aproveite esta curta leitura. A crítica social é mordaz e lhe deixará pensativo por um longo período de tempo.