

andreajguesse @andreajguesse
A VIDA CINZA
Estou observando uma reforma que já perdura há meses. Um retrofit, pelo que li em um site de arquitetura. Uma casa colonial transformando-se em uma casa "moderna". Saiu parte do telhado colonial, entrou uma varanda com laje em balanço—imponente, flutuando com todo o peso do concreto, como se fosse a penugem de um pássaro.
A cor externa, antes em um tom tijolo queimado, deu lugar a um bege acinzentado. O piso da varanda em balanço, cinza. Todo o cimentado da área externa se expandiu, sepultou canteiros e tomou a forma de um mar cimentício oneroso, que tenta imitar a sabedoria popular do cimento queimado—cinza.
A piscina, antes em um tom sobre tom azul de pastilhas, seguida igualmente pela sauna em pastilhas azul mais claro, foi descascada como uma banana. O cinza, ainda mais escuro, tomou conta. Suas pastilhas foram substituídas, ao som interminável da serra elétrica, por peças gigantes de porcelanato idênticas à pedra de ardósia — apenas mais claras, e mais cinzas.
A parede do muro dos fundos resiste; continua em um amarelo suave. Mas não ficará assim por muito tempo. Ontem, foram descarregadas mais latas de tinta, que provavelmente estão em algum tom de cinza.
A modernidade é cinza. Mas o céu ainda é azul. As árvores na rua continuam verdes.
Por quanto tempo as cores da vida resistem à modernidade e a monotonia imposta pelo homem cinza?

andreajguesse @andreajguesse
Medo
Escrevo livros infantis e, até hoje, já publiquei cinco deles. Além disso, também tenho um livro de contos sobre mulheres e as confusões em suas famílias. Decidi que, além de investir mais na divulgação dos meus livros infantis, vou me aventurar a escrever dois livros voltados para o público jovem. A história dessas novelas já está pronta, pulsando dentro da minha mente, ansiosa para ganhar vida.
E por que ainda não comecei? Admito, com certa vergonha, que estou com medo. Medo do desconhecido, do julgamento alheio, de não ser capaz. Medo do novo. Apesar de estar há quase 10 anos trilhando uma carreira como escritora e ilustradora (ou, como costumo dizer, "saindo do armário artístico" /) , meu primeiro livro só foi publicado em 2017.
Disse medo? Bem, hoje o medo se foi. Ao assistir à honestidade de uma mulher incrível, trabalhadora, eficiente e talentosa, como a atriz Fernanda Torres, recebendo o prêmio Golden Globe e admitindo que não estava preparada para ganhar – mesmo sendo uma forte candidata – porque nunca achou que fosse possível, me fez refletir sobre o quanto nós, mulheres, muitas vezes sentimos que não somos boas o suficiente.
A tira da Helô resumiu brilhantemente essa ideia. E, de repente, percebi: não preciso ter medo. Estou preparada. Terei coragem. Coragem não significa não sentir medo, mas sim agir mesmo quando o medo está palpitando dentro do meu peito.

andreajguesse @andreajguesse
Ano Novo, De Novo
Li uma tirinha em que dois ETs observavam a queima de fogos na Terra através de um monitor na sua nave. Um deles perguntou ao outro:
— O que eles estão comemorando?
A resposta foi:
— Mais uma volta da estrela deles em torno do planeta.
O outro, com um olhar curioso, completou:
— E ainda se acham inteligentes...
Somos todos, ou quase todos, engodados por um desejo extraordinário de recomeçar. Um momento para novos inícios, afastando tudo que é desagradável. “Tudo permanecerá igual”, diriam os ETs. “Tudo pode ser diferente”, acreditam os humanos.
A linha entre sonho e realidade é tênue e dura apenas um segundo: o instante que separa o dia 31 de dezembro do dia 1º de janeiro. O resto — 364 dias — está à sua disposição para decidir se seguirá o sonho ou a realidade.