Renata fechou a porta do apartamento e foi para o quarto. Recém havia dispensado os prestadores de serviço que tinha contratado para montar seus móveis. A mudança para aquele prédio mais próximo ao seu local de trabalho fora uma decisão quase repentina. Quando viu o anúncio de um apartamento para alugar, que também estava à venda, pensou que seria uma ótima ideia já ir morando até se organizar e adquirir de vez o imóvel. O prédio era novo e ela gostou da infraestrutura do condomínio, espaços ajardinados, piscina, além da proximidade da orla e de parques onde podia passear e se exercitar.
Tirou as roupas, deixou-as no chão do dormitório e foi para o banheiro da suíte. Entrou debaixo do chuveiro e ficou por um tempo apenas curtindo a sensação da água morna, quase fria, no corpo. Só depois começou a se ensaboar.
Quando se vestia no quarto, ouviu o bipe do celular.
“Oi, Rê! Como estão as coisas aí? Já está acomodada? Se precisar de algo, me diz. Posso te levar uma comidinha se você estiver muito cansada.” — era uma mensagem de Carolina.
“Oi, amore! Não precisa te incomodar, que isso. Eu dou um jeito aqui. Está tudo sob controle. Os rapazes já foram embora, já tomei banho e só quero descansar.”
“Eram bonitos?” — Carolina aproveitou para matar a curiosidade.
“Quem diria, a Dona Carol namorando e de olho nos rapazes que montam meus móveis.” — brincou Renata.
“Estou namorando, mas não estou morta. E só queria saber se são bonitos pra você. Mais lindos que o Marcelo eles não são, isso é certo.”
“Miga, sinceramente, acho até que eram bonitos, mas tô tão cansada que até meu fogo no rabo apagou. Amanhã de manhãzinha eu pego uma gasolina fresquinha pra acender de novo, ok?”
Carolina mandou vários emojis de risadas.
“Ok, miga. Vai descansar, vai. Amo você.”
“Amo você, flor, obrigada por se preocupar comigo.”
Renata cobriu a nudez com um roupão atoalhado rosa apenas porque queria pedir uma pizza e precisava ir buscá-la na portaria. Comeu algumas fatias antes de se ajeitar para dormir e se estender sobre os lençóis de seda como sempre dormia: completamente nua.
Era domingo. Um vizinho idoso que dividia o elevador com Bernardo ia de cara fechada diante das risadinhas do rapaz com suas duas convidadas. Eles carregavam um cooler pequeno e as garotas iam com biquíni por baixo das roupas.
Chegaram à piscina do condomínio que, apesar de ser domingo e fazer sol, não estava tão cheia por já ser fim de março. Bernardo tirou a camisa, suas companhias, duas garotas lindas de vinte e poucos anos, uma negra e uma loira, também tiraram shortinhos e blusas. Entraram os três na água ainda um pouco fria, rindo.
A noite tinha sido intensa e agradável. As meninas, bissexuais, tinham se divertido tanto quanto ele com a dinâmica de trio. Apesar de terem se conhecido na noite de sábado, haviam se entendido perfeitamente.
Alguns vizinhos não aceitaram muito bem a ideia, a julgar pelas caras quando viram os três trocando beijos desavergonhados dentro da piscina. Aos poucos, foi-se abrindo um espaço ao redor deles — o que os deixou ainda mais felizes. Serviam-se de latinhas de cerveja da caixa térmica e continuavam fazendo folia, mergulhando, rindo, se beijando.
Em um determinado momento, Flávia e Rita se agarraram em um beijo que Bernardo apenas admirava, aproveitando-se de poder camuflar a ereção sob a água, quando o olhar dele ultrapassou as duas e alcançou a outra margem, onde havia algumas espreguiçadeiras. Dali ele conseguia ver com clareza uma vizinha deitada de bruços, com um biquíni marrom chocolate muito pequeno, o fio-dental deixando à mostra as nádegas arredondadas. Os olhos de Bernardo seguiram pelas pernas torneadas, grossas, com uma vaga sensação de familiaridade. Que mulher gostosa…, pensou, distraído do casal de garotas que se agarrava à sua frente, bebendo um gole de uma latinha de cerveja. Estava a uns bons metros de distância, seus sentidos, porém, o enganavam e ele pensava que podia enxergar dali a penugem macia e dourada que cobria a pele daquela morena de tirar o fôlego. Ela sentou-se virada para o outro lado, depois pegou algo em uma mesinha lateral e começou a prender os cabelos castanhos ondulados em um coque alto. Quando sua nuca ficou à mostra, Bernardo viu apenas uma imagem irreconhecível de onde estava, mas que tinha certeza que conhecia: era um jarro colorido derramando água. Aquário.
Ficou sério de repente e tudo à sua volta ficou desfocado. Era Renata.
Fazia mais de um ano. Se conheceram no carnaval e depois daquela noite doida, não tinham mais se falado. Deixou a lata ao lado do cooler.
— Meninas, eu já volto. — disse a Flávia e Rita, desviando delas.
Mal tinha dado dois passos, quando um homem de quase dois metros de altura, musculoso, se aproximou de Renata e sentou-se na espreguiçadeira dela. Bernardo estacou no meio da piscina. O homem, negro, cabelo raspado, era bastante atraente e pegou um protetor solar na mesinha lateral. Começou a passar nas costas de Renata, que se virou de lado e deu-lhe um beijo na boca. Em seguida, ela voltou a se deitar e aquelas mãos enormes continuaram distribuindo o creme na bunda e nas pernas dela.
O sentimento que tomou Bernardo era desconhecido para ele. Deu meia-volta e foi até as garotas.
— Já se refrescaram o suficiente? Quem sabe subimos mais um pouco? — convidou.
Agarrou o cooler e ajudou ambas a saírem da piscina pela escadinha. Foram dando a volta até chegar a dois ou três metros de onde estava Renata. Estrategicamente, Bernardo parou ali dando risadas altas, sem virar de frente para a vizinha. Beijou primeiro uma, depois a outra, e saíram lado a lado da área de lazer.
Subiram apenas os três no elevador até o sétimo andar. As garotas colaram o corpo de frente uma para a outra e ele encoxou a que estava no meio, beijando a que estava no outro lado e prensando ambas contra a parede. Chegaram ao apartamento já trocando beijos.
Tirar a roupa, ir para a cama, colocar a camisinha: tudo foi feito em tempo recorde. Bernardo parecia subitamente excitado mesmo antes de entrarem no quarto.
Enquanto beijava ora uma, ora a outra, ele percorria os corpos de ambas, cada uma com uma mão. Deitou-se e Flávia, a loira, sentou em seu pau; Rita, a negra, sentou em seu rosto, invertida. As duas se beijavam e estimulavam os seios uma da outra, enquanto ondulavam sobre ele.
Com uma das mãos, ele puxava com firmeza o quadril de Flávia. Com os dedos da outra mão, penetrava Rita com a mesma energia. Se sentia confuso. Em sua cabeça, estava comendo Renata, como naquele motel, há um ano, com ela cavalgando sobre ele sentado na cadeira erótica. Ao mesmo tempo, estava chupando Renata, quando ela sentou-se na cara dele para chupar seu pau. E, junto com o tesão, ainda sentia raiva porque conseguia ver aquelas mãos grandes espalhando protetor solar nas nádegas dela. Ele, Bernardo, tinha beijado, tinha mordido, tinha comido aquela bunda! Era um sentimento desconhecido para ele: posse.
As garotas já tinham gozado quando ele mesmo chegou lá. Afastou-as de si de maneira meio desinteressada, contrariado com seus pensamentos intrusivos. Pediu licença para ir para o banho e não convidou nenhuma das duas.
Deixou a água gelada cair em cheio em sua cabeça. Lembrou-se daquela terça de carnaval. Tinham se despedido no motel pouco antes de amanhecer. Cada um havia ido embora em um Uber diferente. Ele saíra de lá simplesmente enfeitiçado. Se perguntassem a ele o que sentia, só saberia dizer que o sexo tinha sido indescritível, inesquecível, incomparável. Estava com o número dela. Podia estar sozinho uma hora dessas e era útil ter o contato de uma boa foda garantida. Renata não fazia jogo, era o que ele pensava naquele momento.
Já no sábado seguinte, ficou com uma garota, mas não levou adiante o interesse. Se agarraram na festa e ele foi embora sem levá-la para a cama. Na frente da casa noturna, meio bêbado, procurou o número de Renata na memória do celular para mandar uma mensagem. Estranhou quando descobriu que aquele número não estava no aplicativo, então decidiu ligar. O telefone era de uma velhinha que passou para o marido e ele ainda teve que ouvir desaforos e ameaças, já que o idoso dizia ter um neto hacker que iria caçá-lo e denunciá-lo para a polícia por assédio. Menos mal que não tinha mandado foto do membro ereto, pensou, não estava tão bêbado. Sentiu-se o maior otário. Ele, o grande esperto, tinha sido passado para trás. Ela lhe dera um número falso. Não acredito nisso. Caí no meu próprio truque.
Estava acostumado a fugir das mulheres depois de transar com elas. Muitas vezes não dava seu telefone ou, pelo menos, não o verdadeiro. Não queria “encheção de saco”. Não tinha nada contra ficar algumas vezes com a mesma garota, só não desejava que isso fosse interpretado como algum interesse em relacionamento sério. E, geralmente, quem o procurava eram elas. Havia ficado com uma raiva irracional de Renata naquela hora, só comparável ao tesão que ela lhe despertava.
Em casa, antes de dormir, ficou lembrando dela sobre ele, na cama, de costas. Ele tinha uma bela vista… Podia admirar as costas dela, as nádegas avantajadas, enquanto ela se movia. Um pouco de lubrificante um bom domínio da quicada e pronto: para sua satisfação, ela gostava de anal e fazia como ninguém. Foi difícil para Bernardo não gozar muito rápido como o menino que ela ficava implicando que ele era. Teve que ser mais homem do que nunca. Mas aquela bunda grande deliciosa se movendo, as coxas sob suas mãos… Sentiu-se esvaziar até secar — talvez tivesse algo a ver com já ser a terceira vez que ejaculava naquela noite. E não seria a última.
E naquela madrugada de domingo em que se descobriu enganado, sozinho como não costumava passar o fim de semana, ele bateu punheta pensando irritado em “punir” Renata fodendo-a vigorosamente de todas as formas possíveis. No mínimo, do mesmo jeito que tinham feito naquela noite.
No banho, se deu conta de que já estava de pau duro novamente. Ignorou o fato e se concentrou em se perguntar o que Renata fazia na piscina do prédio. Não a tinha visto antes no condomínio, tampouco o homem enorme que estava com ela. Das duas, uma: ou ele era morador novo, ou ela. Não havia nenhum vizinho antigo por perto para que ela fosse convidada.
Saiu do banheiro e inventou uma desculpa para dispensar Rita e Flávia. Foi para a cozinha inventar algo para o almoço.
Renata achou que aproveitar a piscina do prédio no domingo seria uma boa forma de relaxar, descansar do sábado exaustivo que tivera. Conhecera Fernando em uma confraternização do conglomerado de mídia ao qual pertencia o jornal em que ela trabalhava. Ele era operador de controle-mestre na emissora de televisão. Editava as imagens que iam ao ar. O colega havia lhe mandado uma mensagem convidando para passar o dia na casa dele. Eventualmente transavam, ele tinha uma série de qualidades que ela valorizava: era lindo, gostoso, bem-dotado, fodia bem e era tranquilo, não encanava com compromisso, não misturava as estações. Sabia perfeitamente separar sexo e sentimentos, não enchia o saco mesmo que eles passassem o final de semana juntos. Já haviam até viajado a dois algumas vezes sem que isso afetasse a (não) relação deles. Seguiam amigos que iam para a cama. Fernando tinha trinta e cinco anos e, apesar de mais novo, Renata não chegava a se incomodar com a diferença de idade. Então devolveu o convite chamando-o para ficar com ela em sua casa nova, mais especificamente, na piscina.
Estava tomando sol por volta das 10h. O colega aplicava filtro solar em seu corpo, quando ela ouviu risadas exageradas. Virou o rosto de lado para ver de onde vinham e viu um trio, um rapaz e duas moças, os três muito bonitos (pelo menos de costas). Ele beijou ambas e elas o abraçavam antes de sair da área de lazer e entrar no prédio. Renata viu de relance os braços tatuados do vizinho desconhecido que apareciam na parte descoberta pela manga da camiseta. Sentiu uma sensação de déjà vu que logo afastou beijando Fernando.
— Quer entrar um pouquinho na água, Rê? — ele convidou.
— Vamos, Nando. Até porque daqui a pouco o sol vai estar muito forte e quero ir preparar o almoço.
Os dois sentaram na beirada e entraram na piscina. Em seguida, se abraçaram e se beijaram.
— Que bom que você veio para cá me ajudar a relaxar… É ótimo começar a semana bem descansada. — Renata disse, sorrindo, com os braços ao redor do pescoço de Fernando.
— Você sabe que pode me chamar quando precisar descansar. Posso te oferecer uns orgasmos sempre que você quiser. — ele sussurrou, mordendo o lábio dela.
— Ah, e você é bom nisso. — ela murmurou antes de beijá-lo com ardor.
A semana de Renata seguia a mesma rotina de sempre. De segunda a sexta, das 9h às 18h, trabalho no jornal. Depois das 19h, variava. Segundas e quartas, aula de yoga. Terças e quintas, musculação. Algumas sextas, barzinho com Carolina ou com colegas do trabalho. Alguns sábados, saída para dançar com as mesmas companhias. Se às sextas ou aos sábados não rolasse uma transa casual, tinha alguns amigos como Fernando que podia chamar para manter o sexo em dia.
Já tinham se passado mais de duas semanas da mudança. Renata saiu do jornal e se dirigiu para a nova academia que tinha passado a frequentar, mais perto do novo endereço. Chegando lá, trocou a roupa, vestindo um top e uma legging branca. A sala de yoga era separada dos outros ambientes da academia por uma parede de vidro que isolava o som, mas permitia que todos que circulavam no ambiente assistissem às aulas. Ela se desligou do exterior, concentrada na música de meditação que tocava e na voz tranquila da instrutora, que comandava os movimentos dos alunos.
A rotina de Bernardo também se mantinha igual. De segunda a sexta pela manhã, aula na faculdade. À tarde, se dividia entre musculação e os estudos em casa. Normalmente tinha as noites livres, por isso não raro saía durante a semana, além de sexta-feira, sábado e até domingo. Naquela quarta, porém, tinha feito uma entrevista para estágio e não foi à academia no horário habitual. Eram quase 19h quando ele chegou para treinar.
Estava sentado no aparelho em que exercitava o peitoral, descansando entre uma série e outra, tomando água na garrafa térmica de inox. Como de costume, aproveitou para ver que aula estava acontecendo na sala envidraçada. Quase sempre eram aulas com maioria feminina. A de yoga, que acontecia naquele momento, não era diferente. Ficou analisando os corpos das alunas. Era um apreciador da diversidade, não tinha preferências excludentes. Elas alternavam a postura da vaca e do gato, em quatro apoios, ora empinando a bunda, ora arqueando as costas. Acho que vou fazer yoga…, brincou consigo mesmo apreciando coxas e traseiros. Seus olhos pousaram, novamente, naquele conjunto conhecido, dessa vez coberto por legging e top brancos.
A professora de yoga devia ter mudado o comando, porque as alunas foram trocando de posição para a postura do cachorro olhando para baixo, cada uma formando um V invertido, com a cabeça para baixo, mãos e pés no chão e a bunda para o ar ainda mais alto.
Era Renata, sim. Ela devia mesmo ser sua nova vizinha, e também iria treinar na mesma academia, pelo jeito. E dali parecia que não estava usando calcinha por baixo daquele tecido elástico e grudado como uma segunda pele. Bernardo conseguia se imaginar mudando um pouquinho aquela posição dela e baixando a legging, depois metendo nela com força, tomado por uma mescla de sentimento de rejeição que ela havia causado nele com um desejo intenso.
— Terminou, cara? — um rapaz bem forte estava diante dele.
Custou a entender o que o outro queria. Olhou para o aparelho.
— Ah, sim, terminei. — mentiu. — Desculpa aí, me distraí.
O homem seguiu os olhos dele até a parede de vidro.
— Claro, tem bastante coisa para se distrair aí. — ele riu. — Tem gostosa para todo gosto.
Outra vez, Bernardo experimentava um efeito visual no qual enxergava Renata, enquanto as imagens ao redor dela pareciam desfocadas.
— Uma melhor que a outra! — concordou, se afastando para outro aparelho.
A cada exercício que fazia, ele se mantinha atento aos movimentos de Renata. Quando a aula de yoga terminou, sem sentir, levantou-se e foi se encaminhando na direção dela, que ia para os armários, certamente pegar suas coisas antes de ir embora. Parou bruscamente e fingiu que amarrava os tênis quando viu o professor de musculação abordá-la e ser recebido com sorrisos derretidos. Filha da puta…!, pensou Bernardo. Se abrindo toda para esse pau no cu! O instrutor era um loiro bronzeado quase do mesmo tamanho daquele outro, que acompanhava Renata no domingo na piscina. Costas largas, bíceps esculpidos: Bernardo sabia perfeitamente que tinha o corpo muito bem trabalhado com treino constante, mesmo assim, estava com ciúme e uma ponta de inveja do homem que recebia a atenção de Renata.
Já estava ficando difícil de acreditar que ainda não tivesse terminado de amarrar ambos os cadarços, mas ele só se levantou quando viu o loiro se afastar da jornalista, mexendo no celular com uma cara de satisfação. Ah, ela deu o telefone para ele. Aposto que deu o número certo!, pensou com ódio.
Renata colocou a mochila nas costas e passou distraída por trás dele, sorrindo para o smartphone, rumo à catraca da entrada. Bernardo aproveitou o ângulo para confirmar suas suspeitas e viu que não estava totalmente certo. Ela não estava sem calcinha sob a legging. A peça íntima apenas era tão pequena que só se notava observando com atenção e de perto: era um fio dental que mantinha toda aquela bunda empinada livre, coberta apenas pela fina camada de suplex branco.
— Com licença? — uma garota de shortinho e cropped queria passar no corredor que ele ocupava totalmente, perdido em observar Renata.
— Ah, claro, desculpa. Estava indo encher minha garrafa. — disse, se dirigindo ao bebedouro.